Numa UE ligada à máquina

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Procuro seguir duas regras na análise política sobre qualquer país: não confundir os seus cidadãos com uma conjuntural liderança política ou até um regime imposto pela coerção e evitar generalizações culturais ou sociais muito em voga na boca dos populistas que estão a conseguir afundar diariamente a Europa. Para mim, os políticos não são todos iguais, os muçulmanos não são todos terroristas, os americanos não são todos uns básicos, os iranianos não são todos fundamentalistas, os refugiados não são todos violadores e jihadistas, tal como os dinamarqueses não são todos uns fascistas que se reveem no que a obscena lei do confisco aos exilados comporta: um apagão nos direitos elementares consagrados nas convenções internacionais.

Só que a lei dinamarquesa é apenas mais um sintoma da doença europeia, não a sua causa. Hoje parece mais claro que as principais conquistas comunitárias não passam de estruturas de areia em erosão à mínima tempestade. Basta acompanhar a crise da moeda única em redor da Grécia, economia que vale 2% da zona euro, para nos interrogarmos sobre como é possível ter criado mecanismos tão rudimentares de coesão financeira. Ou olhar para todo o caos na gestão das fronteiras externas da UE, supostamente preparada para em simultâneo salvaguardar Schengen e salvar uns milhares de desgraçados fugidos de guerras que teimosamente consideramos exóticas e longínquas, mas que são uma pequena parte entre os milhões de deslocados à força desumanamente concentrados na Turquia, Líbano e Jordânia, e que fazem tremer as pernas de tantos cínicos europeístas de algibeira. É que foi exatamente no bolso que Merkel foi imediatamente posta pela CSU depois de ter ensaiado uma política tolerante com os refugidos ou que os social-democratas dinamarqueses se enfiaram com medo da direita radical da qual dependem. Resultado? Na primeira sondagem depois da infame lei, desceram 7%. Copenhaga não paga a traidores.

Não há receitas mágicas para o que enfrentamos mas o passa-culpas entre Estados e o agachamento dos partidos moderados está a transformar a Europa num sítio infrequentável, despida de institucionalismo, coragem política e visão estratégica. O que aconteceu em Colónia foi demasiado grave para ser abafado ou esquecido, mas custa ouvir o silêncio sobre os quase 900 ataques a residências de refugiados na Alemanha, em 2015. É que, se as generalizações são perigosas, a falta de comparência política está a matar a UE. Nunca a Europa precisou tanto dela.

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