O recuo de Conceição e a Taça da Liga

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A forma como Sérgio Conceição deixou o banco do FC Porto para assistir ao desempate do jogo com o Sporting no balneário foi desvalorizada face à comprovada irregularidade da presença de Nélson Pereira atrás da baliza onde foram marcados os penáltis, mas feitas as contas pode ser mais relevante. É que nem o facto de, ainda que de forma dúbia, Jorge Jesus ter chamado a si a autoria da ideia chega para transformar a irregularidade tão evidente como irrelevante em verdadeiro caso. Já a ida de Conceição para o balneário me parece uma situação em claro contraciclo com aquilo que é a liderança feita de empatia e sanguinidade que o treinador do FC Porto tem assumido até aqui e que tão bons resultados tem dado.

A ser verdade que foi mesmo Jorge Jesus quem enviou o treinador de guarda-redes para trás da baliza, o que posso dizer é que me escapa em que é que a chico-espertice pode ter tido seja que influência for no desfecho do desempate. Ali, no meio de dezenas de fotojornalistas e atrás dos placares publicitários, não acredito que Nélson pudesse sequer comunicar com Rui Patrício, quanto mais dar-lhe indicações acerca do lado preferido de cada batedor do FC Porto de forma a que ele o ouvisse ou aproveitasse. Não quero com isto esconder a irregularidade, que é clara e há de ser objeto de multa ou até castigo, se é que a possibilidade está prevista nos regulamentos. Só que não me ocorre como é que ter ali Nélson pode ser uma forma de o treinador "fazer tudo para ganhar o jogo", tal como Jesus atestou no final.

Para ser honesto, também não creio que o FC Porto tenha perdido o desempate porque no momento da decisão Sérgio Conceição optou por recolher aos balneários em vez de ficar no banco, à distância de um grito de incentivo para os seus jogadores. Da mesma forma que não acredito que o Benfica tenha perdido a final da Taça dos Campeões Europeus de 1988, frente ao PSV Eindhoven, porque Toni virou as costas ao relvado no exato momento em que Veloso avançou para a marca dos 11 metros e acabou por permitir a defesa de Van Breukelen. O mais provável é mesmo que a maioria dos jogadores nem se tenha apercebido da ausência do seu líder. A questão que se coloca aqui é mais de compreensão, porque o recuo de Conceição é pouco ou nada condizente com a liderança tão presente e empática, tão à jovem Mourinho, que o treinador portista tem assumido desde o início da temporada e que tão decisiva foi para transformar a equipa amorfa da época passada no coletivo ambicioso e ganhador que segue na frente da Liga.

Na verdade, a questão de Sérgio Conceição não deve ser colocada na perspetiva do efeito que a sua atitude pode ter provocado na equipa, mas sim do que a causou. E aí não consigo encontrar uma explicação plausível. Queria ver melhor e o ecrã de televisão é a melhor forma de o fazer? Fraca explicação. É superstição? Estranho. Não me ocorre uma justificação melhor do que um acesso súbito de desânimo nascido de mais um clássico em que o FC Porto foi melhor mas não foi capaz de fazer golos - e já vão três no que se leva de temporada. E isso é aquilo de que o FC Porto menos precisa, porque muito do que esta equipa tem rendido tem que ver com a união e o entusiasmo que o treinador conseguiu incutir no grupo com a sua proximidade e o discurso motivacional de que a roda final é exemplo tão feliz.

PS - A minha presença na RTP3 aos sábados à noite impede-me de me centrar devidamente na final da Taça da Liga, ontem disputada entre Vitória FC e Sporting. Há tempo e espaço ainda para três pensamentos rápidos, ainda assim. O primeiro para destacar o grande jogo feito por Gonçalo Paciência, imparável em lances de um para um, a mostrar um virtuosismo raramente visto num avançado da sua compleição física. O segundo para assinalar a clara superioridade da estratégia desenhada por José Couceiro face ao plano de jogo completamente falhado por Jorge Jesus, que abdicou das faixas laterais e apostou numa equipa sem velocidade nem intensidade durante toda a primeira parte, em claro sinal de menosprezo pelo adversário. Por fim, o terceiro para questionar o que pode ser a época do Sporting depois do ato falhado que foi a final de ontem: a um candidato ao título exige-se muito mais do que aquilo que os leões mostraram em Braga, com uma taça à mão de semear.

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