Inevitavelmente, tomamos medicamentos, desde que nascemos até ao final da vida. Por isso, todos nós beneficiamos dos avanços conseguidos pelas ciências farmacêuticas.A título de exemplo, pensemos na história da Aspirina. Antes, como substância natural, obtida a partir da casta do salgueiro (daí a designação de salicilina), no tempo de Hipócrates, na Antiguidade Grega, era já receitada para combater a febre. Muitos anos depois, na dobradiça do século XIX para o XX, o cientista alemão Félix Hoffmann, da empresa Bayer, descobriu a sua síntese (1897). Foi desde logo, lançada a sua produção como medicamento indicado para tratar a febre e dores. Mais tarde, a partir de 1980, foi, também, comprovada a sua eficácia como anticoagulante para prevenção de acidentes vasculares como o enfarte do miocárdio.Ora, a nova indicação de um medicamento, diferente em relação à inicial (reposicionar o medicamento) alcança especial relevo atual. Tal como aconteceu com a Aspirina, também o Viagra foi reposicionado para tratar a disfunção eréctil, mas de princípio era destinado para a hipertensão arterial. Os exemplos multiplicam-se. Poupa-se tempo, recursos e vidas. Em vez de começar do zero, a aprovação para reposicionar medicamentos para novas indicações terapêuticas é mais rápida, mas obedece a métodos científicos. Tem relevância estratégica para Portugal, Espanha e França em iniciativa apoiada pela União Europeia. Convoca académicos, investigadores e especialistas, envolvendo universidades, polos tecnológicos, centros de investigação, sociedades científicas e empresas biotecnológicas num esforço transnacional, colaborativo.Neste âmbito, a Sociedade Portuguesa de Saúde Pública, que colabora no Projeto, conduz as atividades de comunicação e literacia para a saúde, na perspetiva em promover a perceção coletiva sobre o reposicionamento de medicamentos, uma vez que não basta desenvolver soluções tecnológicas. É preciso que sejam socialmente aceites.O foco, agora, é reposicionar outros medicamentos em oncologia. É uma necessidade urgente. Há perspetivas prometedoras. Os doentes não podem esperar. O reposicionamento permite encurtar a autorização terapêutica, ao utilizar a que já existe, mas com novas finalidades, com menor risco e menor custo, sem dispensar a validação científica nem substituir os ensaios clínicos. É uma forma de inovar para tratar doenças raras e emergentes. O Projeto de reposicionamento de medicamentos visa maior rapidez aliada a impacto social positivo. Fazer mais com menos. É uma alternativa eficiente e sustentável em saúde pública.O futuro depende também da coragem em repensar o passado para avançar. Ex-diretor-geral da Saúdefranciscogeorge@icloud.com