Depois de um período de superpolitização, marcado pela tomada de posse do novo governo, pela eleição de um novo líder da oposição e pela aparição de Aníbal Cavaco Silva, o país chegou às comemorações do Dia de Portugal compreensivelmente farto de política..Marcelo Rebelo de Sousa, o mais apurado termómetro dessa morna piscina em que se tornou a República, percebeu-o de pronto, proferindo um discurso inofensivo - ainda que não incipiente - a seguir ao ancião constitucional, Jorge Miranda, antes focadíssimo no dilema nacional que é as faculdades terem nomes em inglês e as redações darem erros de ortografia, renomeando episodicamente o 10 de Junho para dia de Portugal, de Camões, das comunidades, da raça e dos fait-divers..Como em todas as piscinas, o chapinhar provoca onda, mas não ondulação. O ciclo noticioso satisfez-se com a indiferença da data, com as intervenções professorais e nem Costa - que, ausente da água, prontamente lhe retira profundidade - fez grande falta..CitaçãocitacaoÉ um erro, fruto de ingenuidade ou inconsciência, julgar que as águas paradas do nosso banheiro não secarão. É um erro presumir que por se pregar que a inflação é temporária esta não terá o poder de alterar definitivamente a vida dos portugueses.esquerda.Foi, no entanto, de uma coincidência algo avassaladora, para quem se presta a tais mergulhos, que o Parlamento tenha votado novamente a despenalização da eutanásia na semana em que se morre num SNS que já nem partos consegue assegurar, que se tenha marchado e batido continência a umas Forças Armadas que foram desorçamentadas em plena guerra, que a senhora porta-voz do Exército propagandeie que não há carências estruturais na Defesa e que se tenham "celebrado" as "comunidades" quando há menos de seis meses os emigrantes viram os seus votos irem para o lixo devido a uma lei eleitoral que, até agora, nem governo, nem oposição se preocuparam em corrigir..É um erro, fruto de ingenuidade ou inconsciência, julgar que as águas paradas do nosso banheiro não secarão. É um erro presumir que por se pregar que a inflação é temporária esta não terá o poder de alterar definitivamente a vida dos portugueses. A inflação vai engolir o PRR, os aumentos salariais previstos no Programa do Governo e os alívios fiscais nos combustíveis em velocidade cruzeiro. É um erro, para o PSD em particular, defender um referendo sobre a eutanásia e entregar ao mesmo tempo o espaço conservador da sociedade ao Chega, que seria seu porta-voz nesse debate. Um erro que o centro-direita - se deseja sobreviver à transformação do sistema partidário - não deve cometer em momentos igualmente definidores e vindouros, como a regionalização e as presidenciais: dividir-se ainda mais. Muito basicamente, se Luís Montenegro ambiciona abanar o barco, convém não meter água. E é também um erro que o PS, alegadamente adversário de corpo e alma do dr. Ventura, prossiga bipolarizando o sistema contra o dito, ignorando ou desprezando o PSD como interlocutor e escrutinador democraticamente eleito pelos portugueses. Se António Costa quer salvar a democracia da extrema-direita não pode destruir a direita que não é extrema - independentemente da sua maioria absoluta..Caso contrário, para manter o usufruto da imagem, os nossos líderes políticos podem ter toda a vontade de saltar olimpicamente da sua prancha, que o seu inevitável destino será a conversão em panqueca, neste gasto azulejo azul-bebé chamado regime..Colunista