O mandato mal começou e Moedas já mostrou ao que vem. Basta a primeira semana para perceber que o presidente da Câmara de Lisboa optou por um caminho autoritário, opaco e profundamente hostil à democracia. Comecemos pelo gritante. Os Sapadores Bombeiros, a quem confiamos a vida nos momentos mais frágeis, entram em greve porque não têm equipamentos de proteção individual, trabalham com efetivos reduzidos, as viaturas e as instalações não têm o mínimo de dignidade. Não exigem privilégios – exigem condições básicas. Querem ser recebidos pelo presidente da Câmara. Não é um capricho: é o mínimo que se espera de quem lidera a cidade.No que toca ao Alojamento Local, situação igualmente alarmante. O novo regulamento está em discussão desde o anterior mandato, mas Moedas conseguiu travar a votação. Resultado: a suspensão de novos registos terminou e abriu-se a porta a uma corrida descontrolada ao AL. A oposição pediu debate imediato – Moedas e o Chega recusaram. E agora percebemos porquê: os rácios para as zonas de “contenção absoluta” e “contenção relativa” são agora o dobro. Em plena crise habitacional, com famílias forçadas a sair da cidade, rendas que consomem mais de 80% do rendimento, o presidente decide alimentar o problema. Não é incompetência. É escolha política – das piores.E agora o escândalo da proposta de delegação de competências. A lei é claríssima: no executivo, de 17 eleitos, todos têm a mesma legitimidade. O voto do presidente só vale mais em caso de empate. Moedas decidiu que isso não é suficiente. Com o apoio da extrema-direita, passa a decidir sozinho, sem sequer ir a reunião de câmara, sobre alterações orçamentais, alienação de património – incluindo imóveis de uso habitacional –, licenciamento urbanístico de impacto relevante, refeições escolares e medidas estruturais de ação social. Tentativa descarada de transformar um órgão colegial num gabinete de um só homem, em atropelo evidente ao escrutínio e à pluralidade que os lisboetas escolheram nas urnas. Para garantir que ninguém o questiona, Moedas fez aprovar esta quarta-feira, de novo com o Chega, uma proposta de Regimento em que passa a ser o presidente a decidir em exclusivo o que é discutido, reduz o tempo de intervenção dos vereadores da oposição, retirando-lhes até a palavra quando há participação do público, limita o número de propostas de alteração que podem ser apresentadas e restringe o período antes da ordem do dia (PAOD). Nunca se tinha visto tamanha agressão às regras de funcionamento democrático da Câmara. É um regimento para calar, controlar e procurar esmagar a oposição.A pluralidade? Ignorada. A transparência? Eliminada. O direito ao exercício político da oposição? Reduzido a pó. Os eleitores que não votaram Moedas? Tratados como ruído indesejado. E tudo isto com o argumento de alegada “modernização” e eficácia… Ao agir como um Rei-Sol que ensombra a democracia, Moedas desrespeita a pluralidade que deveria ser riqueza e não obstáculo. E, acima de tudo, desrespeita o próprio modelo democrático de governação da cidade. Mete o Chega no bolso e afasta quem fiscaliza, escrutina e questiona. E escolheu fazê-lo logo no início, na esperança de que o choque passe depressa.Convém recordar o óbvio: o executivo não é Moedas e o seu círculo. O executivo são 17 eleitos. E cada vez que o presidente tenta governar sozinho, não é a oposição que desrespeita – é a cidade, que não se vai calar. Isto vai dar mau resultado, depois não venha vitimizar-se.Dirigente da Associação Política Cidadãos Por Lisboa