Em 1988, a jornalista Dina Aguiar anunciava na RTP a primeira greve geral convocada em conjunto por CGTP e UGT. Oito meses depois de vencer as eleições legislativas com maioria absoluta, Cavaco Silva conseguia outro feito inédito: o pacote laboral apresentado pelo seu Governo unia as desavindas centrais sindicais.Trinta e sete anos depois, Luís Montenegro, convicto delfim do Professor Cavaco, a quem acaba de homenagear em São Bento, pode orgulhar-se de replicar o efeito do mestre: UGT e CGTP voltam a convocar uma greve geral conjunta contra o anteprojeto de lei da reforma da legislação laboral apresentado pelo atual Governo logo após a vitória nas legislativas de maio. Desta vez já sem Dina Aguiar para a anunciar, aposentada há poucas semanas da televisão pública, esta é apenas a quinta greve geral organizada em conjunto pelas duas maiores intersindicais no Portugal democrático. Pelo meio, também José Sócrates e Passos Coelho (detém o recorde, com duas) foram “brindados” com duas greves gerais conjuntas de CGTP e UGT, a última das quais em 2013.O peso histórico deste anúncio não pode ser subestimado. Para o Governo de Luís Montenegro, é um aviso claro: avançar com uma reforma laboral profunda sem abertura ao diálogo não só arrisca desgastar a sua base social, como pode alimentar um clima de contestação persistente que tende a corroer a legitimidade e a estabilidade política, como vimos já várias vezes no passado. Até porque, convenhamos, o programa eleitoral da coligação PSD/CDS, com linguagem positiva sobre modernização e valorização do trabalho, não deixava antever a dimensão real da reforma agora proposta. Montenegro, que prometeu valorizar a concertação social, vê-se agora perante um teste à sua capacidade de escuta e de negociação.Mas a anunciada greve de 11 de dezembro não testa apenas o Governo: testa também o sindicalismo. CGTP e UGT enfrentam um desafio estrutural, com filiação em declínio e dificuldades de mobilizar os jovens, que, mostram-no as tendências mais recentes um pouco por todo o lado, parecem hoje aderir mais entusiasticamente a ideias neoliberais - como valorização do mercado sobre o Estado, individualismo, “meritocracia” e mobilidade laboral – do que à ação e movimentos coletivos.Conseguirão os sindicatos demonstrar relevância e captar a atenção das novas gerações que vivem num mercado de trabalho cada vez mais precário, flexível e digital? Conseguirão convencê-las de que direitos não são obstáculos, que flexibilidade não tem de ser sinónimo de precariedade e que esta luta não perpetua desigualdades?No final, a greve de 11 de dezembro coloca-se como um duplo teste: para o Governo, sobre sensibilidade política e capacidade de negociação; para os sindicatos, sobre força social e renovação geracional. De um lado e de outro, uma questão comum em aberto: o que vale, de facto, uma greve geral no Portugal de hoje?