Donald Trump deixou Jair Bolsonaro e o bolsonarismo caírem de vez. Em julho, o presidente norte-americano, por culpa da influência do deputado Eduardo Bolsonaro sobre os radicais da Casa Branca, anunciou taxas muito superiores à média internacional para setores estratégicos do Brasil, como carne ou café, para pressionar o presidente Lula da Silva e o Supremo Tribunal Federal (STF).Dois meses depois, alertado de que o preço dos bifes e das bicas estavam a explodir nos EUA, Trump recuou, chamou Lula de “very good guy”, disse que sentia uma excelente química com ele e, não só baixou drasticamente as tarifas, como concordou em montar uma parceria Washington-Brasília contra o crime organizado. Mais: dia 12 retirou as sanções económicas que o governo americano havia imposto a Alexandre de Moraes, o juiz de Jair, para forçar o magistrado a absolver o ex-presidente.Trump era a esperança internacional de Bolsonaro e do bolsonarismo de se manterem relevantes porque intramuros o abandono já era mensurável: no primeiro mês em prisão domiciliar, o STF recebeu 123 solicitações de visitas a Bolsonaro, contabilizou o jornal O Estado de S. Paulo. No segundo, 30. No terceiro, 10, a maioria deles membros de um grupo de oração evangélico ligado à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro cuja função é manter o detido espiritualmente animado. É até triste. Mas justo. Quando, em 2014, ninguém achava viável a candidatura à presidência de Bolsonaro, então um mero deputado de baixo clero grosseiro e reacionário, foi o jurista Gustavo Bebianno, quem, contra as expectativas, acreditou no potencial eleitoral dele, oferecendo serviços de advogado e chefe de campanha gratuitamente. Uma vez eleito, em 2018, para dar espaço na máquina ao filho Carlos, o novo presidente chutou Bebianno para canto, que morreria amargurado de ataque cardíaco, em março de 2020, aos 56 anos.Fabrício Queiroz, pau para toda a obra do deputado Bolsonaro e prole, foi desprezado quando teve o nome envolvido no desvio de salários de assessores protagonizado pelo filho Flávio. E o empresário Paulo Marinho, que cedera a própria mansão como quartel general do candidato, acabou afastado do círculo íntimo do poder à primeira discordância. Joice Hasselmann ou Alexandre Frota, o General Santos Cruz ou o Major Olímpio, outras figuras mais bolsonaristas do que Bolsonaro que ajudaram a erguer o candidato, mal questionaram a influência dos filhos do presidente nos rumos do governo foram triturados por fake news.E Mauro Cid, o faz tudo oficial do presidente, foi largado como bode expiatório quando a polícia descobriu que o líder falsificou cartões de vacina para entrar nos EUA, desviou para o bolso jóias oferecidas ao estado pela Arábia Saudita e planeou derrubar e matar Lula. Até resolver delatar o chefe e fazer ruir o castelo de cartas bolsonarista. O que Bolsonaro está a viver, chama-se karma. Só falta Trump, que ouviu até um apaixonado “I love you” do ex-presidente brasileiro que agora marginaliza, viver o seu.Jornalista, correspondente em São Paulo