O Estado de Trump... por Trump

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A tradição do Estado da União remonta a George Washington, o primeiro presidente dos EUA. Foi o general herói da guerra da independência a fazer, em 1790, o primeiro de uma série de discursos regulares diante do Congresso. Mas Thomas Jefferson, o terceiro presidente, havia de descontinuar a prática por ser demasiado “monárquica”, e que só em 1913 seria retomada, por Woodrow Wilson. Desde então, todos os meses de janeiro, os presidentes americanos falam diante de uma sessão conjunta do Senado e da Câmara dos Representantes para fazer um balanço do ano. No primeiro ano de mandato, como foi agora o caso de Donald Trump, eleito em novembro, o discurso é feito mais tarde e não é oficialmente um Estado da União. No caso do presidente republicano, aquilo a que assistimos foi mais um Estado de Trump... feito pelo próprio Trump.

Durante 100 minutos - o mais longo em 60 anos - o presidente republicano fez um discurso sobretudo para consumo interno. Fiel à sua retórica - não muito diferente de um comício de campanha -, Trump reafirmou que a “América está de volta”, garantiu que tem “um mandato como não se via há décadas” e sublinhou que o seu primeiro mês no cargo foi “o mais bem-sucedido da história da nossa nação”.

Autoelogios não faltaram num discurso em que a política interna ocupou, segundo contas da CNN, mais de 32 minutos, a imigração quase 15, a economia 14. O seu próprio regresso à Casa Branca ocupou mais de dez, no que a colunista do jornal The New York Times Maureen Dowd apelidou de um “Estado de Si Próprio”. Em comparação, a política externa ficou-se pelos cinco minutos, a maioria a ler uma carta que o presidente ucraniano lhe terá enviado, num esforço de reaproximação depois do encontro tenso entre os dois durante a visita de Zelensky a Washington há dias.

Entre a apologia dos cortes feitos por Elon Musk à frente do Departamento de Eficiência Governamental e as críticas às políticas do antecessor, o democrata Joe Biden - que culpou por vários males, inclusive o elevado preço dos ovos -, Trump só por um momento reconheceu que nem tudo pode ser cor-de-rosa no futuro, admitindo que as tarifas que impôs a Canadá, México e China podem causar “um pequeno transtorno” aos norte-americanos.

Com a popularidade de Trump nos 45%, mas a aprovação das suas políticas mais alta (81% aprovam a deportação de imigrantes ilegais condenados por crimes, 60% apoiam negociar com a Rússia para acabar com a guerra na Ucrânia, segundo uma sondagem Harvard CAPS/Harris), os democratas vão precisar de mais do que vaias ou plaquinhas com a palavra “mentiras” para convencer o eleitorado de que são alternativa já nas Intercalares de 2026.

Editora-executiva do Diário de Notícias

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