O Chega é mesmo anti-sistema? 

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O principal argumento político do Chega é o de que este partido luta contra os partidos fundacionais, há cerca de 50 anos, da nossa democracia. “Somos contra o sistema e queremos refundar a República”, brada repetidamente o líder, André Ventura, que proclama a pureza do Chega em contraponto à “corrupção” dos “partidos do regime”. 

Acontece que essa “pureza” parece ser ficção, dada a quantidade de quadros políticos deste partido que tiveram cargos relevantes nos partidos que mais tempo e mais lugares ocuparam no aparelho de Estado da nossa democracia. 

A contradição começa, como se sabe, no próprio André Ventura, militante do PSD durante cerca de 15 anos, candidato e vereador da Câmara de Loures social-democrata em 2017. 

A deputada Maria Manuela Tender foi deputada do PSD de 2011 a 2019, eleita por Vila Real e ex-vereadora desse partido em Chaves (agora candidata-se pelo Chega). Desfiliou-se do PSD em janeiro de 2020. 

Rui Cristina foi deputado do PSD pelo Algarve (2019-2024), mas seria depois deputado do Chega em 2024. 

Henrique de Freitas foi Secretário de Estado da Defesa de Durão Barroso e deputado do PSD de 1999 a 2009. Foi eleito deputado do Chega em 2024. 

Eduardo Teixeira foi militante do PSD durante mais de 30 anos, foi deputado à Assembleia da República pelo PSD. Em janeiro de 2024 anunciou a migração para o Chega e foi eleito outra vez deputado. 

António Maló de Abreu foi deputado do PSD eleito pelo círculo da Emigração de 2019 a 2023. Demitiu-se do PSD em 2023 e pouco depois aderiu ao Chega, mas acabou afastado por André Ventura. 

António Pinto Pereira, ex-militante do PSD, juntou-se ao Chega em 2023. É deputado. 

Miguel Côrte-Real era um antigo líder da bancada do PSD na Assembleia Municipal do Porto. Desfiliou-se do PSD em 2025 para se candidatar pelo Chega e é o cabeça-de-lista do partido à Câmara Municipal do Porto. 

Lina Lopes é outra antiga deputada do PSD (2019-2022) e antiga líder das Mulheres Social-Democratas. Em 2025 foi apresentada como candidata do Chega à Câmara Municipal de Setúbal, mas retirou a candidatura para se defender de acusações que considera difamatórias. 

Nuno Afonso foi conselheiro nacional do PSD na liderança de Passos Coelho e, tal como Ventura, foi candidato autárquico do PSD em Loures. Co-fundador do Chega em 2019, tornou-se vice-presidente do partido, mas acabou por romper com Ventura em 2022, abandonando o Chega. 

Também do CDS-PP vieram quadros para o Chega: André Reis, Manuel Campos, Torcato Moura e isto sem contar com Diogo Pacheco de Amorim, que colaborou com o CDS-PP na distante década de 1980. 

E até do PS, o partido que André Ventura mais vilipendia, vieram quadros: António Parada, antigo vereador da Câmara de Matosinhos pelo PS, que rompeu com o partido em 2013 e em 2025 aliou-se ao Chega. Eduardo Gonçalves que foi presidente da Junta de Freguesia de Caminha, eleito pelo PS, mas anunciou a sua filiação no Chega em 2025 para ser candidato do partido à Câmara Municipal de Caminha. Afonso do Nascimento que foi um autarca eleito pelo PS (presidiu à Junta de Freguesia de Vila do Bispo) e mais tarde por um movimento de independentes - em 2025 surge como candidato do Chega à Câmara de Vila do Bispo. 

E fico por aqui, que o espaço é curto. 

Conclusão? O Chega não é um partido anti-sistema. O Chega é um partido de desempregados do sistema à procura de um empregozito. 

 Jornalista

Diário de Notícias
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