O Bolsonaro 2.0

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Notado apenas por ameaçar explodir bombas em quartéis caso o soldo não fosse aumentado, Jair Bolsonaro foi um “mau militar”, disse o general Ernesto Geisel, presidente da República da ditadura. E, com dois projetos aprovados em 27 anos de férias pagas no Congresso, um mau deputado, mostra-nos a matemática.

Por estimular desmatadores, cultivar o atraso, asfixiar qualquer sinal de vida inteligente no país e ainda conduzir a pandemia com a habilidade de um genocida, foi um mau presidente, reza a História. E, ao conspirar um golpe de Estado e meter ao bolso um punhado de joias de recordação do Planalto, é também um mau ex-presidente, acusa a polícia.

Mesmo assim, Bolsonaro tem, segundo as sondagens, altos índices de popularidade. “Por que não eu então?”, ter-se-á perguntado Pablo Marçal.

Primeiro, as apresentações: Pablo Marçal, 37 anos, coach de “profissão”, é um dos candidatos a prefeito de São Paulo nas Eleições Municipais de outubro.

Aos 18, integrou uma quadrilha que desviava dinheiro de bancos online, mas, como delatou os comparsas, esteve preso apenas por uns dias. Aos 35, já coach, arrastou 32 incautos para uma serra, sob chuva, “para vencerem o medo”, experiência que só terminou quando os bombeiros, nove horas depois, resgataram os desaparecidos, vencidos pelo medo.

Palestrante, jurou que um dia o motor do helicóptero onde seguia falhou e que foi ele quem avisou e acalmou o piloto. Noutra ocasião, contou que um engenheiro chinês queria copiar-lhe o cérebro e colocar o conteúdo num robô para que a Humanidade não desperdiçasse a sua inteligência.

Virou meme, claro: “Quando o Graham Bell inventou o telefone já tinha uma chamada perdida do Pablo Marçal”, “Quando Pablo Marçal nasceu, quem chorou foi o médico”, lê-se em duas das milhares de piadas em homenagem ao ex-ladrão, coach e palestrante.

Com este currículo nas mãos e a ascensão eleitoral de Bolsonaro na mente, bateu então à porta do PRTB, partido com ligações, segundo investigação da Polícia Civil, ao Primeiro Comando da Capital, a maior organização criminosa da América do Sul, a solicitar candidatura a São Paulo. Foi convidado imediatamente a ir a votos.

Tem resultado: com duas semanas de campanha, já está empatado nas sondagens com Ricardo Nunes, candidato bolsonarista, e Guilherme Boulos, candidato lulista. E, depois de nos primeiros debates ter caluniado toda a gente e recortado os vídeos mais escabrosos dessas calúnias para viralizarem na internet, conseguiu o que pretendia: Nunes e Boulos, e mesmo Datena, um candidato que apresenta noticiários com crimes hediondos, alegaram falta de estômago para participar no debate seguinte.

Como, na sequência dos ataques mentirosos, as contas de Marçal nas redes foram suspensas, o candidato lamentou-se como se tivesse, digamos, levado uma facada na barriga - e a tendência após as facadas é crescer nas sondagens.

E Bolsonaro? Vendo o segmento imbecil do eleitorado trocar de aldrabão, diz que Marçal “não tem caráter”. O filho Eduardo, a perceber o gado a fugir para as mãos do coach, pergunta: “Onde você estava em 2022?”. Já o filho Carlos, outrora maior bully da internet brasileira, depois de ter sido chamado “retardado” por Marçal disse apoiar a candidata do IL em versão brasileira à prefeitura.

O bolsonarismo não estava preparado para alguém ainda pior. Veremos se São Paulo e o Brasil estão.

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