Com Jair Bolsonaro inelegível, certamente, e preso, provavelmente, sucedem-se os movimentos à direita para herdar o espólio eleitoral do ex-presidente nas eleições de 2026. Mais ou menos metade dos pretendentes tem como principal ativo o apelido, a ex-primeira dama e cônjuge Michelle Bolsonaro, o senador e primogénito Flávio Bolsonaro e o deputado e terceiro filho Eduardo Bolsonaro. Os outros apresentam como trunfo fundamental o trabalho no governo dos respectivos estados - Ronaldo Caiado no de Goiás, Ratinho Júnior no do Paraná, Romeu Zema no de Minas Gerais e Tarcísio de Freitas no de São Paulo.Os primeiros, caso avancem, por causa do tal sobrenome e da exposição nacional a que foram submetidos desde 2018, dispensam, ou quase, apresentações. Já os segundos, se se arriscarem mesmo na corrida, têm de percorrer o país e fazerem-se notados.Pode causar estranheza a observadores portugueses que mandatários de estados como Goiás, 7,5 milhões de habitantes e quase quatro vezes a área de Portugal, Paraná, 12 milhões de habitantes e mais do dobro do tamanho de Portugal, Minas Gerais, 21,5 milhões de habitantes e sete portugais dentro dele, ou São Paulo, 46 milhões de habitantes e o triplo do tamanho do pequeno país europeu, precisem, pelo gigantismo dos feudos que administram, de apresentações.Mas no Brasil, por ser continental, é assim. Nos EUA, os feitos do governador, digamos, do Arkansas, também não chegam com facilidade aos ouvidos dos, por exemplo, texanos. E, na União Europeia, o dia a dia do chefe de estado da Eslovénia é ignorado em Portugal e vice-versa. Os brasileiros consomem, sobretudo, o noticiário local - que já é bem mais intenso e emocionante do que o noticiário nacional português. E quando ouvem o nacional ficam a saber das atividades do presidente e demais autoridades de Brasília, dos grandes temas internacionais e pouco mais. Por isso, Caiado, Ratinho, Zema e Tarcísio devem mesmo “nacionalizar-se”.Em 2018, por exemplo, era Lula da Silva, que depois de disputar cinco eleições e governar por oito anos se tornou conhecido em todos os rincões do país, quem estava impedido de concorrer. Para o substituir escolheu Fernando Haddad. Haddad acabara de governar São Paulo, a maior cidade do Brasil, das Américas, do hemisfério sul, por quatro anos. E, nos oito anteriores, fora um aplaudido ministro da Educação de Lula, primeiro, e de Dilma Rousseff, a seguir. No entanto, reportagens a semanas da eleição daquele ano constataram que parte dos nordestinos, que vivem a milhares de quilómetros de distância física e mediática dos grandes centros, ainda dizia que iria “votar no Lula”, mesmo com o ex-sindicalista numa cela de Curitiba. Outra parte, supostamente mais informada, já respondia: “vou votar no substituto do Lula, o Andrade!”.Por essas e por outras, à esquerda não há dúvidas: em 2026, recandidata-se Lula mesmo com 80 anos. E em 2030? Aí provavelmente terá de ser mesmo o Andrade, perdão, o Haddad.Jornalista, correspondente em São Paulo