Nem tudo tem a mesma importância
Na vertigem do nosso agitado dia-a-dia somos frequentemente assaltados por notícias que se impõem mais pelo caricato que encerram, pela insistência com que são divulgadas ou pelos laivos de escândalo que antecipam, do que pela sua própria relevância.
Melhor, pela relevância do que nos transmitem.
Há largas décadas, 1961, Raul Solnado, produziu, e é reproduzida até hoje, uma charla sobre a guerra. Entre munições que escasseavam, a guerra com horários de abertura e de encerramento e as balas que serviam os dois contendores em confronto, todos nós, nalguma circunstância, nos teremos divertido a ouvir o imortal Solnado.
Acontece que, entre várias notícias sobre os assuntos mais diversos e da mais diversa relevância, fomos agora assaltados por notícias verdadeiramente relevantes.
Depois de referências esparsas e imprecisas em vários órgãos de comunicação social, o Expresso, com a credibilidade que todos lhe reconhecemos, veio confirmar que o país está sem capacidade de socorro aéreo de emergência.
O adjudicatário do serviço não terá, ainda, nem helicópteros nem os respetivos pilotos e, pelo que relata aquele semanário, parece que a prioridade não é resolver o problema. Antes é a de encontrar um culpado numa troca de acusações entre adjudicante e adjudicatário.
As dificuldades de explicação são tantas e dadas numa linguagem tão “cifrada” que um leitor médio não consegue perceber exatamente o que se está a passar.
Ter-se-á então tomado a decisão, que só podemos aplaudir, de fazer um ajuste direto e, principalmente, de lançar mão da Força Aérea e dos seus helicópteros.
E é aqui que Raul Solnado nos vem à memória.
Por estranho que isso possa parecer ao comum dos mortais, como nós, os helicópteros militares, certamente vocacionados essencialmente para participar na defesa da nossa soberania, só podem voar de dia.
Que a guerra só comece ao nascer do sol e termine com o pôr do sol, sendo estranho, é, até, bastante positivo.
A guerra nunca devia existir, de dia ou de noite.
Agora, de uma assentada, ficarmos a saber que não só não temos helicópteros para guerra noturna, como, sobretudo, não temos capacidade para socorro aéreo noturno, já nos parece que deveria merecer uma explicação aos portugueses. Explicação cabal, clara, transparente e entendível. E a explicação não passa por fazer dos portugueses ignorantes dizendo que a “emergência médica também vai ser assegurada com aviões”.
Estou convicto que o nosso parlamento já discutiu assuntos de menor importância, desde logo porque, para nós, nada é mais importante que a vida humana.
E é a vida humana que está em causa!
Advogado e gestor