Lisboa parece viver num espetáculo permanente, onde anúncios grandiosos substituem resultados concretos e onde a fronteira entre o público e o privado se vai dissolvendo, como tinta mal aplicada num pavimento gasto. Carlos Moedas, o autarca que prometeu uma gestão moderna e transparente, que diz falar em nome das pessoas, tem-se revelado um verdadeiro ilusionista político, um mestre na arte de criar narrativas deslumbrantes enquanto a realidade da cidade se degrada diante dos olhos dos lisboetas. Comecemos por um número mágico, os 16 mil empregos anunciados a partir da Fábrica de Unicórnios. Sublinhe-se o requinte retórico da palavra “anunciados”. Anunciados, proclamados, propagandeados. Uma promessa de impacto quase messiânico, mas que levanta mais perguntas do que respostas. Onde estão esses empregos? Em que setores? Com que contratos? Correspondem a lisboetas ou mesmo residentes que pagam impostos em Portugal? Ou será uma ilusão que se irá dissipar ao primeiro sopro de escrutínio? Até agora, ninguém sabe. É o equivalente político a dizer que se descobriu ouro em Lisboa, mas sem nunca mostrar a pepita. Ilusão de Carlos Moedas: o Parque Papa Francisco como novo espaço verde da cidade. A realidade são 30 hectares de descampado, um cartão de visita elucidativo do legado de Carlos Moedas à vista de todos os que entram em Lisboa pela ponte Vasco da Gama. Lembra-se das promessas de Carlos Moedas sobre as ciclovias? Foram cumpridas com uma ilusão intitulada de “expansão da rede ciclável”. Em vez de construir infraestruturas seguras, Moedas aposta nas chamadas “vias 30 + BCI”: basta pintar umas linhas e uns desenhos no asfalto, e eis mais umas centenas de metros de ciclovias de Moedas. É a ciclovia low-cost — uma forma barata de fingir progresso enquanto os ciclistas continuam a disputar espaço com carros e autocarros. Na política da ilusão umas latas de tinta bastam. Mas avancemos na panóplia de ilusões. O programa Saúde 65+, destinado aos idosos, oferece consultas por telefone e vídeo. Moderno? Sim. Unicorniano? Claramente. Eficaz? Só se a sua maleita puder ser resolvida com uma palmadinha virtual nas costas. Caso contrário, o conselho final será sempre o mesmo: “procure um médico”. É uma ilusão que tem a particularidade de ter custado mais a ser publicitada do que implementada. A Lisboa de Moedas é amazing. Mas o espetáculo não se limita às políticas públicas — estende-se também à promoção pessoal do próprio Moedas. A recente polémica em torno do seu livro é reveladora. A defesa de Moedas é previsível: o livro seria uma forma de “prestar contas aos munícipes”. Contudo, quando os recursos públicos financiam projetos pessoais, a linha entre comunicação institucional e autopromoção desaparece. Surpresa? Nenhuma. Não só existem centenas de mupis espalhados por Lisboa com autopropaganda, como este é o mesmo Carlos Moedas que apareceu em 260 fotografias numa revista da Câmara Municipal de Lisboa com… 252 páginas. Espelho meu, espelho meu… Enquanto Moedas escreve capítulos sobre si próprio, Lisboa continua a enfrentar problemas reais: falta de habitação, transportes caóticos, ruas sujas e jardins ao abandono. O tempo e a energia da câmara deviam estar dedicados a estas prioridades, não a alimentar a carreira política do seu presidente. Lisboa não precisa de mais ilusões. Os lisboetas sobretudo não precisam de mais ilusões. Precisam de líderes que prestem contas com atos visíveis, não apenas com páginas impressas ou promessas pintadas no chão. Até lá, a cidade continuará refém deste espetáculo mediático, aplaudindo de forma amarga enquanto se desmorona um jardim, uma rua e uma promessa de cada vez. Ilusão, atrás de ilusão. Presidente da Junta de Freguesia de Alcântara