A questão é antiga. Quando as convicções de quem tem poder se impõem a factos fundamentados do ponto de vista científico é geralmente a ciência quem fica a perder. Giordano Bruno e Galileu que o digam: um morreu queimado e outro teve de renegar o que acabara de provar em relação ao movimento da Terra. Decorre esta introdução histórica da sonegação de certos conteúdos relativos à educação sexual da disciplina de cidadania e desenvolvimento. Quer dizer, passaram a estar omissos e, ao mesmo tempo nem por isso, segundo as palavras do ministro numa recente entrevista à SIC. Parece que se mantém nas aprendizagens essenciais, mas depois acabaram riscadas no contexto da disciplina de cidadania.Os argumentos ligados a valores mais conservadores sobre a questão da sexualidade são sempre os mesmos: expor crianças e jovens a informações ligadas à sexualidade irá promover comportamentos de natureza sexual. Ora o que os estudos demonstram é exatamente oposto, ou seja, quando se analisam o impacto de programas de educação sexual em jovens verifica-se que estes diminuem os comportamentos sexuais de risco e muitas vezes atrasam o início da vida sexual. A abordagem desta problemática torna-se ainda mais importante quando demasiados jovens têm acesso a conteúdos sobre sexualidade na internet.Vivemos num tempo em que a opinião vale tanto como qualquer estudo empírico. A educação não pode nem deve, no entanto, ser pensada com base em convicções, mas no que a evidência demonstra ser favorável ao desenvolvimento das crianças e jovens. A puberdade e adolescência, como todos sabemos, comportam mudanças físicas e psicológicas complexas. A vivência equilibrada dessas alterações implica a compreensão dos processos por parte dos jovens que estão a passar e a integração dessa compreensão na forma como se relacionam com os outros.O desenvolvimento da sexualidade faz parte integrante da formação da identidade e tem implicações no autoconceito, autoestima e nas atitudes. Assim sendo, não basta passar informações sobre o aparelho reprodutor, os métodos de contraceção ou as doenças sexualmente transmissíveis numa qualquer e eventual aula de biologia. É fundamental que essas informações se conectem com dimensões emocionais, relacionais e de atitude. Por exemplo, o relacionamento heterossexual na adolescência fornece o contexto para o desenvolvimento do papel psicossexual. As situações associadas aos namoros implicam para o convívio com pessoas do género oposto, aprendizagem de novos comportamentos associados ao afeto, mas também a aprendizagem da valorização como rapaz/rapariga num processo de clarificação da identidade psicossexual. Ou seja, a educação para a sexualidade tem associada as dimensões do respeito e de igualdade de género, de respeito por outras orientações, a capacidade para exprimir emoções e afetos, a análise dos comportamentos riscos, entre outras dimensões. É este carácter integrador e abrangente que torna abordagem desta temática relevante na disciplina de cidadania e desenvolvimento. O que está em causa é a valorização, não apenas a informação utilitária, mas as atitudes de reconhecimento do outro, de empatia, da expressão de receios e afetos e da capacidade para integrar esse tipo comunicação nas relações interpessoais. A educação relativa ao desenvolvimento sexual implicava a participação emocional e responsabilização em relação a comportamentos de risco. Bons programas nesta área promovem a saúde física e mental. E prevenir comportamentos de riscos, gravidezes indesejadas e a felicidade relacional dos jovens é o que qualquer pai deveria desejar. Escritora e Professora do Ispa – Instituto Universitário