Mandatário por Lisboa

Publicado a

Não sou militante de nenhum partido, mas tenho votado sistematicamente no Partido Socialista. Mesmo nas últimas eleições, votei com convicção para que Pedro Nuno Santos pudesse ser primeiro ministro. Porquê? Porque achei que a sua juventude e as suas convicções podiam ser úteis ao País. Fui esquerdista na minha juventude, tinha 25 anos quando aconteceu o 25 de Abril, cresci numa família do reviralho, a ditadura era deprimente, tinha dois irmãos emigrados, um avô que adorava enfartado na prisão, um tio exilado e a minha mãe despedida do emprego por razões políticas. Que podia ser eu em 25 de Abril de 1974? Um anti fascista militante, jovem médico com grandes ambições, a preparar-se activamente para emigrar para os EUA, não concebia ir para a guerra colonial. Não por cobardia, mas por não concordar com essa guerra, achava que povos africanos tinham direito à auto determinação e à independência. Vivi o 25 de Abril com um entusiasmo deslumbrante e até votei Otelo nas primeiras presidenciais por gratidão, embora sabendo (ou porque sabia) que não iria ganhar. Nas cinco eleições seguintes votei sempre no candidato vencedor, e embora não tenha votado Cavaco Silva quando foi eleito por duas vezes, reconheci e aceitei que a sua experiência política e a sua competência foram as razões que levaram a maioria dos portugueses a não concordar comigo. Tentei convencer o meu querido tio Mário a não se candidatar pela terceira vez e já com 80 anos contra Cavaco Silva, mas embora sabendo da inevitável derrota acabei, também por gratidão e enorme admiração por pôr a cruz em frente do seu nome. Depois veio Marcelo, e nele votei duas vezes, num político experiente, votei na competência, na qualidade humana, no democrata culto, na certeza de que seria um grande Presidente. Fui sempre, mesmo na minha actividade profissional um defensor da especialização e da competência, um feroz adversário do amadorismo e do facilitismo. Todos os eleitos para Presidente da República com a democracia consolidada, foram como tinham de ser políticos cultos, com enorme craveira, com grande experiência, democratas assumidos, e não menos importante resilientes a adversidades, encarando as derrotas como episódios naturais na luta democrática. Mário Soares, Jorge Sampaio, Cavaco Silva e Marcelo Rebelo de Sousa foram derrotados em eleições democráticas, antes de ganharem a eleição presidencial. Mas foram à luta, não desapareceram, continuaram a expor-se ao escrutínio dos portugueses.

Em democracia temos de aceitar com naturalidade a escolha das maiorias. Winston Churchill, quando derrotado nas primeiras eleições após a grande vitória na Segunda Grande Guerra, onde foi protagonista, disse o fundamental. Foi para que isto pudesse acontecer que ganhamos a guerra. Em Janeiro de 2026, vamos eleger o próximo Presidente da Republica. Temos, para o mais alto cargo político da Nação de eleger um político experiente, com competências específicas, resiliente e culto, sendo que essa cultura, além de geral tem de ter aspectos particulares, cultura jurídica, cultura económica, cultura social. Alguém habituado a criar consensos, a ter no seu passado hábitos democráticos, alguém a quem reconhecemos e identificamos essas características. Fui amigo íntimo de três Presidentes da Republica em quem votei por convicção. Votei em políticos em quem reconheci competências fundamentais, independentemente dos partidos onde demonstraram essas qualidades.

Não faz sentido, para o mais alto cargo dirigente da Nação, não elegermos um político. De quem conhecemos o que pensa, de quem conhecemos as suas competências, a quem reconhecemos as suas convicções democráticas. Nunca votei no PSD em eleições legislativas. Mas irei votar Luís Marques Mendes nas próximas eleições para Presidente da Republica. Aceitei ser seu mandatário por Lisboa (convite surpreendente e lisonjeiro), pela simples razão de que o meu apoio é claro, total e racional. Não é um apoio envergonhado, nem me sinto a trair as minhas convicções socialistas democráticas. Nas autárquicas, em Lisboa votarei na Alexandra, que bom seria ganhar a dobradinha!

Cirurgião.

Escreve com a antiga ortografia

Diário de Notícias
www.dn.pt