Lula e os elefantes

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Na sala de Lula da Silva no Palácio do Planalto, além de mesas imponentes e cadeiras confortáveis, de tapetes caros e de quadros de autor, está lá, no canto, um elefante: chama-se Nicolás Maduro.

Maduro é um elefante na sala de Lula, desde logo, por causa da aliança histórica entre lulismo e chavismo: quando os adversários do atual presidente do Brasil querem assustar os eleitores de centro inventam que, com ele no poder, o país “vai virar uma Venezuela”, agitando os números económicos mais recentes do “regime bolivariano” - recuo de 62% do PIB de 2013 para 2023, 68% de pobreza extrema e 63,3% de inflação.

Além disso, o elefante Maduro ameaçou, no final do ano passado, tomar a Província de Essequibo, equivalente a 70% da área da Guiana, invadindo para esse efeito, se necessário fosse, território brasileiro.

Mais: o paquiderme venezuelano, depois de sugerir que a Venezuela cairia num “banho de sangue” em caso de vitória da oposição nas eleições de 28 de julho e ouvir Lula manifestar preocupação por esse desatino, mandou o presidente brasileiro “tomar chá de camomila” para se acalmar.

Depois, como resposta a um pedido do Brasil por eleições justas, Maduro igualou a sua manada à manada de Jair Bolsonaro ao lançar suspeições estapafúrdias sobre o rápido, eficaz e fiável Sistema Eleitoral brasileiro.

Já após o sufrágio, aliás, irritado com o pedido do Centro Carter para divulgação imediata dos resultados por secção de voto, tomou as dores de Donald Trump ao perguntar por que razão aquela ONG não se manifestou quando o candidato republicano acusou, sem provas, as eleições americanas de 2020 de fraude.

Porque Maduro, no fundo, fez por estes dias o que Trump, em 2021, e Bolsonaro, em 2023, quiseram fazer, mas não conseguiram graças à solidez das instituições dos EUA e do Brasil, que as da Venezuela não têm.

Posto isto, enquanto algumas das democracias da América Latina de direita e de centro já decidiram reconhecer o candidato de oposição como vencedor - casos de Argentina, Uruguai, Peru e outras -, a Lula, olhando de soslaio com indisfarçável incómodo para o elefante no canto da sua sala no Planalto, restou, assim como aos homólogos de centro-esquerda da Colômbia, do México e outros, dizer que só se pronuncia depois de ver as atas eleitorais.

Uma posição diplomática desconfortável, mas equilibrada: mantém compromisso, acima de tudo, com a democracia, sem, para já, avalizar nem o discurso de Maduro, nem o da oposição.

A posição diplomática equilibrada, porém, desequilibrou-se dias depois quando a comissão executiva nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), a força política fundada por Lula e cuja atuação se confunde com a do presidente, soltou uma nota apressada e suicida onde reconhece “o agora reeleito Maduro”.

O PT, portanto, sem combinar com o Governo que diz apoiar, legitimou o mesmo Maduro que desafia as fronteiras territoriais do Brasil, que desrespeita Lula, que faz coro com Bolsonaro contra o Sistema Eleitoral brasileiro e cujo regime, autoritário e ruinoso, quando associado à esquerda brasileira se traduz na perda de milhões de votos de democratas de centro.

Em suma, na sala de Lula no Planalto, além de mesas imponentes e cadeiras confortáveis, de tapetes caros e de quadros de autor, há dois elefantes, Nicolás Maduro e o PT.

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