Hormonas da felicidade

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Ontem de manhã, na Antena Aberta da Antena 1, o tema da discussão era o tempo de espera nos hospitais públicos. As notícias dos últimos dias têm sido pouco originais: horas e horas de esperas nas urgências, sobretudo nos hospitais de maior afluência, como é o caso do Amadora-Sintra. Depois de vários ouvintes terem deixado a sua opinião, uma ouvinte diz a seguinte frase: “É muito cansativo ouvir sempre as pessoas a queixarem-se”. Confesso que não ouvi mais nada depois disso, porque me distraí a pensar que estava precisamente a refletir na mesma coisa enquanto ouvia o programa.

É certo que temos razões para nos queixarmos: 17, 10 ou mesmo sete horas de espera – ou três, como a média de ontem revelava – num hospital, não é algo que seja aceitável num país dito desenvolvido.

No entanto, vale a pena olhar melhor para os números: há hospitais do país onde o tempo de espera para a primeira observação não chega aos 10 minutos – como era o caso da Urgência de Albufeira ontem, à hora a que este texto foi escrito – ou em que os casos muito urgentes estavam a ter atendimento em 13 minutos, como no Hospital de Santa Maria Maior, em Barcelos.

E é nestas alturas que temos de nos lembrar de algo que nem sempre é fácil: o país não existe apenas nas grandes cidades (que bom!), e nem tudo é mau. Podia ser melhor? Devia. Mas a verdade é que, não raras vezes, o desalento gera desalento e não ajuda a olhar para o ‘copo meio cheio’.

E isto não é apenas conhecimento empírico. A ciência mostra que a felicidade começa com substâncias químicas no cérebro. Hormonas como a serotonina, a dopamina e a oxitocina são fundamentais para um estado de entusiasmo e esperança: a serotonina faz-nos sentir bem, a dopamina motiva-nos e a oxitocina ajuda-nos conectar-nos com outras pessoas.

Ou seja, são hormonas que nos ajudam a olhar com atenção e apreço para todas as unidades de saúde que funcionam; para todas as vidas que foram salvas pelo trabalho das equipas competentes com que temos o privilégio de contar; para todos os pacientes que, graças a boa prestação de cuidados, puderam ser devidamente acompanhados e voltar para as suas famílias ou ver os seus problemas resolvidos.

Há muitos, demasiados problemas para resolver nos Hospitais de Portugal – e em tantos outros por essa Europa fora – mas há algo que talvez não fosse má ideia aprendermos com os povos do hemisfério sul, conhecidos pela forma ‘leve-leve’ como encaram a vida, pelo samba que os anima e pela arte que os eleva, a cada momento. Devíamos concentrar-nos, todos os dias, nas coisas boas que temos, sem deixar de trabalhar para melhorar as menos boas. E sem perder o entusiasmo a certeza de que entusiasmo e exigência geram qualidade.

Ou seja, trabalhar no aumento das nossas hormonas da felicidade. Mal não nos fará.

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