Homenagem a Miguel Seco

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Na sequência de uma infeção, tão rápida como traiçoeira, acaba de nos deixar o nosso querido amigo Miguel Seco. Muitos recordá-lo-ão pelo magnífico e irrepreensível caráter, tão ativo e eficiente como discreto e tranquilo, à frente da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Espanhola durante os últimos dois anos, onde, depois de uma longa e sólida trajetória no setor bancário, conseguiu pôr em ordem e em perfeita harmonia uma instituição tão fundamental para as relações económicas entre Portugal e Espanha. Fê-lo, aliás, servindo-se apenas de umas armas tão frágeis como eficazes: a simpatia natural, o carinho para com todos, o saber estar sempre no seu lugar, evitando qualquer protagonismo pessoal e apoiando sempre aqueles que encontrava em dificuldades.

Miguel Seco era, além do excelente e exemplar marido de Ana, o orgulhoso pai, e com toda a razão, de duas maravilhosas filhas, às quais deu uma educação esmerada, sem olhar a meios, mesmo que tivesse de cortar noutras despesas. Para o nosso amigo Miguel, a família era uma prioridade absoluta, dando assistência também ao seu sogro a quem trouxe para viver com eles em Lisboa.

Miguel Seco era um galego de pura cepa. Chegou a Lisboa há quase 30 anos. Sempre foi fiel a um princípio que considerava essencial para conseguir que as relações entre os que considerava serem os seus dois países avançassem sem jamais prejudicar um em relação ao outro. Miguel era não só afável, como, sobretudo, equânime.

Durante muitos anos foi o farol que guiava a quantos espanhóis desembarcassem em Lisboa. Reunia-nos com frequência e esforçava-se para que nos conhecêssemos e nos ajudássemos entre todos. Apresentava-nos, além do mais, aos seus inúmeros amigos portugueses e fazia com que, pouco a pouco, nos integrássemos na sociedade lisboeta. Eu creio que, como bom galego, tinha uma varinha mágica e, com a sua sabedoria, e quem sabe inclusivamente talvez com alguns poderes mágicos, transformava-nos de raiz para passarmos de castelhanos ariscos, catalães prudentes ou andaluzes extrovertidos a luso-espanhóis em definitivo, como ele próprio, melhores pessoas, mais abertas e muito mais tolerantes.

Miguel Seco gostava de falar com todos, sempre sem levantar a voz, quase como quem conta um segredo, como se desvendasse a chave para se ser mais feliz neste mundo, sem dar muita importância às suas palavras sábias. Interessava-se pela cultura e acompanhou sempre com o seu carinho e bastante paciência, todos os que, de uma ou de outra maneira, apoiamos com a nossa pequenez as atividades conjuntas de Espanha e Portugal neste âmbito.

Há uns dias tive a grande sorte de partilhar com Miguel um último almoço. Na varanda do Grémio Literário confessou-me que em nenhum outro lugar, como em Lisboa, podemos desfrutar de uma luz mágica e irrepetível que muda de tonalidade a cada instante. Despedimo-nos com um forte abraço e um até breve.

Agora que a notícia do seu falecimento nos deixou consternados, desejo que essa luz maravilhosa o acompanhe no Céu e que, de alguma maneira, sirva para mitigar a dor da sua família e a que partilhamos todos os seus amigos.

Descansa em paz, querido Miguel.

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