Há mar e mar, nem ir, nem ficar

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Ficou famosa a frase do poeta Alexandre O’Neill para o Instituto de Socorros a Náufragos, numa campanha publicitária, alertando-nos para os perigos do mar – aparentemente calmo, podendo ficar revolto – e a necessidade de termos atenção e segurança nas praias. Foi assim que surgiu aquele que acabou por ser um ditado popular: “Há mar e mar, há ir e voltar”. 

Temo que, apesar de não ter qualquer inclinação para a poesia, Mariana Mortágua inaugurou uma nova versão dessa frase. Está mais perdida que Ulisses a tentar o regresso a Ítaca. Ele ainda chegou a ir a Tróia, ela, dificilmente chegará a Gaza.  

Acrescente-se o facto de alguns responsáveis da “flotilha” – ou frotilha, ou frotinha, como quiserem chamar - terem “abandonado o barco”, ao tomarem conhecimento de que alguns dos activistas também defendem a causa LGBT e o resto das letras do alfabeto. Algo que o Hamas é contra. E já matou muita gente só porque era homossexual ou defendia as causas “do arco-íris”. É caso para dizer que isto é capaz de não correr bem, mesmo que Israel deixe passar a grupeta de barcos. E desculpem utilizar o vocábulo “grupeta”, não de forma desmerecedora para a pequena frota, mas porque não pode ser um conjunto de barcos em condições, pois parecem estar mais tempo parados em reparações do que em curso. Só espero que cheguem ao destino antes do final do ano. Se as pessoas em Gaza estivessem a precisar desta ajuda para sobreviver, seria dramático. Como disse Giorgia Meloni, o governo italiano poderia ter tratado disso e chegaria lá mais rápido. Porém, dessa forma já não havia espaço para toda a atenção mediática e os dramas dos supostos ataques de drones que está a sofrer. Em resumo, Mariana anda perdida no mar, não chega a ir, nem carece voltar.  

Finalmente apercebeu-se de que não poderia deixar mais tempo o Parlamento vazio – perdeu já uma quantidade de discussões importantes pela sua irresponsabilidade – e foi substituída. 

Talvez esta viagem seja o último prego no caixão do BE: dificilmente, mesmo que os votantes do Bloco sejam todos pró-palestinianos e anti-semitas, não votaram para Mariana aproveitar as últimas semanas de sol do Mediterrâneo. Foi para tratar dos assuntos que se discutem no parlamento português, em representação das ideias bloquistas. Há mar e mar, nem ir, nem ficar. 

 Professora auxiliar da Universidade Autónoma de Lisboa e investigadora (do CIDEHUS)

Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico

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