Grupos americanos voltam a casa para encontrar um jogo viciado
Há uma semana a Apple anunciou que investiria US$ 500 biliões nos EUA nos próximos quatro anos, incluindo uma nova mega fábrica no Texas para produção de servidores IA e a criação de 20.000 postos de trabalho dedicados a I&D espalhados por todo o País. O anúncio resulta de encontros entre o CEO da Apple, Tim Cook, e Donald Trump para discutir as implicações para a Apple do aumento das tarifas de importação apresentado pelo Presidente. Com a produção espalhada por todo o Mundo mas muito na China e na Índia, Tim Cook quis apresentar a Trump um gesto de boa vontade que lhe permitisse condições especiais nas tarifas. O Presidente agradeceu à Apple e a Tim Cook sublinhando que a medida refletia a confiança da empresa no seu Governo – mas não se comprometeu.
A oferta de Cook não é nova. Já durante o primeiro mandato de Trump em 2018, a Apple investiu US$ 350 biliões nos EUA ao longo de cinco anos, prestou uma ajuda preciosa a trazer a TSMC – Taiwan Semiconductor Manufacturing Co que produz cerca de 90% dos semicondutores mais avançados do mundo – para o Arizona e ajudou a introduzir legislação para reforçar a produção de semicondutores nos EUA. Estas últimas foram duas das maiores medidas de política industrial de Trump durante o seu primeiro mandato ... e tiveram o dedo da Apple. No mês passado, a empresa reforçou este apoio começando a produzir em massa chips com o seu próprio design numa das fábrica da TSMC no Arizona .
A Apple anunciou esta semana a construção duma instalação de 25,000 metros quadrados em Houston, onde montará servidores para os seus centros de dados, vai aumentar os seus centros de dados em seis Estados e expandir o seu Fundo de Fabrico Avançado apresentado como um “compromisso multibilionário da Apple para produzir silício avançado” na fábrica da TSMC no Arizona.
Tudo parece correr bem até que surge a Índia. Donald Trump percebe que a maior parte dos Iphones vendidos nos EUA vêm da Índia e diz a Tim Cook que pare de produzir iPhones na Índia e os fabrique nos EUA. “Tive um pequeno problema com Tim Cook ontem”, disse Trump sobre sua conversa com o CEO da Apple, em Doha. “Eu disse-lhe: Tim, você é meu amigo. Tratei-o muito bem e você oferece US$ 500 biliões de investimento no nosso País. Mas agora dizem-me que está a montar iphones em toda a Índia. Pode fabricar os seus produtos na Índia para o mercado indiano. Mas têm de parar com os iPhones Made in India que a Apple vende nos EUA, isso tem de parar.“ O ecossistema da Apple na Índia é o maior fornecedor de Iphones para os EUA e um dos maiores criadores de empregos do país. Para a Apple, a Índia é uma peça vital e Trump sabe-o bem ... mas Cook parece que ainda não aprendeu que quanto mais se oferece ao Presidente mais ele exige – dá-se a mão e ele agarra o braço.
A Apple apareceu como um cavaleiro branco a brandir as maravilhas de voltar a casa com grandes ambições de investir nos EUA esperando que Trump favorecesse a empresa nas tarifas de importação. Terá sido esse o acordo ... mas Tim Cook foi ingénuo, não viu o escorpião escondido e deixou que ele espetasse o ferrão no seu cavalo branco.
Não tenho dúvidas que o caso da Apple seja a ponta visível de um icebergue de engano e má-fé que vai afetar todas as grandes empresas americanas de presença industrial global. Para quem tenha dúvidas, recomendo reler o clássico Art of the Deal de Donald Trump.
Empresário, Gestor e Consultor