O cronómetro marcava 21 minutos de jogo. Quase cinquenta mil pessoas iniciam um aplauso sentido que durou sessenta segundos, até soar o minuto 22. Foi assim que, mais uma vez, os portugueses homenagearam Diogo Jota no estádio de Alvalade, no último sábado. Já passava dos noventa minutos quando Rúben Neves, o melhor amigo de Diogo, subiu ao terceiro andar e cabeceou para o golo da vitória sobre a Irlanda. Nas costas, levava o número 21 – o número que era do amigo quando ainda estava entre nós. De dedo erguido, apontou ao céu e ofereceu-lhe o golo.Lá do alto da bancada, percorri o estádio com o olhar. Naquele mar de gente, é impossível distinguir ricos de pobres, doutores de operários, claros de escuros, fiéis de infiéis, nortistas de sulistas. Nada disso importa. Ali, são todos adeptos da seleção, fundidos numa apoteose que ultrapassa o mero espetáculo desportivo. O futebol é, sem dúvida, um poderoso fator de coesão e de identidade coletiva, um espaço de encontro entre gerações e culturas, e um instrumento notável de inclusão.Num tempo em que o mundo parece avançar, inexoravelmente, para uma cultura de crispação – tantas vezes à beira do ódio –, viciado em sublinhar diferenças e divergências mais do que semelhanças e convergências, o futebol resiste como uma das poucas linguagens verdadeiramente universais. É capaz de unir comunidades e nações em torno de valores comuns: o esforço, o mérito, a solidariedade, o respeito e o trabalho em equipa.Na semana passada, na Cidade do Futebol – o quartel-general da Federação Portuguesa de Futebol –, teve lugar a Portugal Football Summit, um megaencontro que reuniu treinadores, jogadores, árbitros, dirigentes, adeptos e profissionais de todas as áreas que se cruzam com a modalidade: saúde, performance, tecnologia, comunicação, gestão, marketing, formação, entre outras. Este evento de quatro dias, concebido pelo presidente da FPF, Pedro Proença, e que contou com as intervenções dos presidentes da UEFA e da FIFA, permitiu-me observar duas dimensões marcantes do fenómeno.A primeira é a centralidade de Portugal no ecossistema do futebol europeu. Os testemunhos de personalidades internacionais de relevo, tanto do futebol profissional como do amador, evidenciam o reconhecimento da credibilidade e da excelência do nosso futebol. Aquilo que alguns chamam “milagre português” não é mais do que o resultado de uma combinação rara: organização, conhecimento, talento e vontade. Uma conjugação virtuosa que se tornou uma verdadeira obsessão positiva – um desígnio nacional.A segunda dimensão foi a adesão vibrante dos jovens adultos à causa do futebol. Em redor dos múltiplos palcos da cimeira, sentia-se o talento a fervilhar: centenas de homens e mulheres ávidos de aprender, de partilhar, de crescer. Quem ainda pensa que o futebol é apenas o destino de quem quer ser jogador está redondamente enganado. Nesta modalidade maravilhosa, laboram dezenas de profissões, desenvolve-se conhecimento, aplica-se tecnologia e gera-se valor. É um mundo vasto, criativo e dinâmico, que continua a preencher o imaginário de milhares de jovens profissionais.Professor catedrático