Fundação Primavera: quando a glória se faz silenciosa
Nasceu há dias. Chama-se Fundação Primavera e é o corolário de uma das mais extraordinárias histórias de amizade, de empreendedorismo, de sucesso e de generosidade que conheci. José Dionísio e Jorge Batista têm uma humildade do tamanho do seu caráter, o que faz com que, ao invés de tantos outros, não espalhem ao vento a glória da sua obra. É justamente por isso que lhes dedico esta crónica.
Recordo os colegas José e Jorge dos tempos em que nos cruzámos na Universidade. Tal como eu, eram estudantes de Engenharia e desportistas. Desdobravam-se entre as aulas de Engenharia de Sistemas e os treinos de voleibol. E ainda lhes sobrava tempo para escreverem software de Contabilidade. Rapidamente perceberam algo que, sendo hoje óbvio, não o era na época: o desenvolvimento e a disponibilização de soluções de gestão em ambiente Windows era a chave para escalar o seu produto.
A veia empreendedora dos dois amigos inseparáveis resultou na criação de um grupo empresarial conhecido por Primavera BSS, que foi conquistando um papel de liderança entre as empresas nacionais de sistemas de gestão, a que se sucedeu um bem-sucedido processo de internacionalização. Em várias visitas que fiz ao seu edifício de escritórios, que ostenta uma icónica fachada de vidro, deparei-me com uma empresa moderna e profissional, o que não me surpreendeu, mas reencontrei também a gentileza, a generosidade e a inteligência dos seus sócios, que permaneceu intacta desde os tempos em que nos cruzávamos nos corredores universitários. Muito enfaticamente, intitulavam-se co-CEOs.
A empresa de sucesso foi, entretanto, vendida a um importante grupo internacional e, quando muitos poderiam pensar que José e Jorge, com as respetivas famílias, se sentariam à beira-mar sobre os milhões que ganharam como fruto do seu trabalho, eis que surge a Fundação Primavera.
Os dois amigos protagonizam um recomeço, com o intuito de impactar positivamente a sociedade, no país que é o seu e olhando para dois segmentos vulneráveis: os idosos, tantas vezes encurralados numa existência de solidão; e as crianças, que não raramente crescem sem igualdade de oportunidades.
Há umas semanas encontrei José Dionísio e, numa breve conversa, explicou-me o projeto da Fundação Primavera. Depois do empreendedorismo, da empresa de sucesso, dos postos de trabalho que criaram, do volume de negócios que geraram e dos impostos que pagaram, pareceu-lhes natural - e a mim também - que o ciclo se completasse com a filantropia.
Não querendo ser injusto com a classe empresarial portuguesa, não posso deixar de sinalizar a escassez de exemplos como os de José Dionísio e de Jorge Batista, que nos ensinam que a vida só é inteira se dermos na medida em que recebemos. Um tango que os dois, e as suas famílias, souberam dançar com a resiliência, o talento e a generosidade dos grandes. Que tenham muito sucesso nesta nova etapa.
Professor catedrático