Agora que já passou mais de uma semana das eleições autárquicas, creio que já podemos voltar ao tema, mastigados que estão os resultados e suas consequências. Não apenas porque continuamos a lidar com as centenas de cartazes dos vários partidos - que são todos a favor da sustentabilidade e do cuidado com a natureza mas não os retiram imediatamente após as campanhas, preferindo deixá-los a descascar ao sol e à chuva, enquanto papel e plástico vai escorrendo pelos postes onde estão presos - mas sobretudo para vermos o que fica. E o que fica, depois de mais umas autárquicas em que todos foram vencedores (como sempre), é um profundo desalento quando se olha para o país. Durante as últimas semanas, todas as freguesias importaram, mas umas mais do que outras - a verdade é que os partidos se focaram nos chamados ‘bastiões’, concelhos onde detinham há mais ou menos tempo a liderança e onde não a podiam perder. Até ela lhes escapar. Sucederam-se arruadas, promessas, convicções, apertos de mãos, missas, tudo o que fosse preciso para garantir que o número de eleitores a votar na cor certa garantia a vitória. Os líderes dos vários partidos conseguiram, em uma ou duas declarações, sacrificar autarquias, concentrando esforços noutras, sem sequer tentarem disfarçar que o faziam com consciência. Prometeram coisas que não vão cumprir, libertaram-se de outras, aliaram-se a improváveis companheiros, decidiram quais as cidades que queriam realmente manter ou ganhar, porque isso lhes permite medir o pulso para as eleições que acham que interessam: as presidenciais de 2026 e as legislativas que hão-de chegar em 2029. Mas no final, não deixamos de ter a sensação de que quem perdeu foi o país. Não há política mais importante do que a local: é uma boa autarquia que garante qualidade de vida aos seus cidadãos, que garante que um concelho ou freguesia rejuvenesce ou envelhece, enriquece ou prefere trocá-lo por outro. E é, também, nas autarquias locais, que vemos mais exercícios de ego e de uma luta intensa por um cargo que, apesar de parecer de poder, é na verdade um cargo de serviço. Uma semana depois das autárquicas, e passando por vários concelhos que não são ‘bastiões’ - logo, não são relevantes para os líderes partidários - aquilo que se sente é o seguinte: fora das grandes cidades, Portugal continua abandonado à sua sorte. Sem escolas, sem hospitais, sem empregos, sem perspectivas de futuro, sem vistos gold, sem cimeiras de tecnologia, sem restaurantes com nome de cozinheiros e sem políticas que velem pelo seu futuro. E, pior do que tudo, sem pessoas. Ou cada vez com menos.