Excecionalismos

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Umas eleições excecionais, uma tomada de posse excecional, um presidente excecional, um país excecional. Assim se pode resumir o discurso de Donald Trump. “As recentes Eleições Presidenciais serão lembradas como as maiores e mais importantes na História do nosso país”, sublinhou. “A partir de hoje, o nosso país florescerá e será respeitado novamente em todo o mundo”, disse. “Fui salvo por Deus para tornar a América grande novamente”, afirmou. “Não há nenhuma nação como a nossa nação”, garantiu.

Trump correspondeu àquilo que esperavam os americanos que nele votaram, criticando o legado de Joe Biden e pondo a ênfase no crescimento da economia, no combate à imigração ilegal e no ataque ao wokismo.

Num estilo messiânico, de alguém que renasce das cinzas, seja sobrevivendo a um atentado, seja regressando à Casa Branca, prometeu o melhor dos mundos, ou seja a melhor das Américas, pois foi um discurso para uma audiência interna, mesmo sabendo que o resto do planeta estava a ouvir.

Fez apelos à unidade, lembrando o I have a dream de Luther King. Foi também buscar a História como inspiração, como quando falou do sucesso das 13 colónias originais, quando prometeu pôr astronautas em Marte (alusão ao discurso de Kennedy em 1962, sobre a América pôr um homem na Lua até final da década), ou quando referiu Mckinley e Teddy Roosevelt, aqui claramente por causa da reivindicação do Canal do Panamá.

Para quem, fora da América, aliados ou inimigos, escutou Trump em busca de pistas sobre a política externa, não houve muitos países citados para além do Panamá, mas a mensagem de força foi evidente e provavelmente nada a resume com mais eficácia do que a promessa de perfurar mais e mais, o célebre we will drill, baby, drill. Com essa arma da energia, graças a uma extraordinária capacidade de produção de petróleo e de gás, a América consegue impor-se à Rússia, cuja economia de guerra precisa do petróleo a bom preço, compete com a China, segunda maior economia mundial, mas dependente das importações energéticas, e pressiona os países do Golfo Pérsico, cujo poder depende da cotação do barril de crude.

É evidente que essa arma da energia, aliada à diplomacia e a umas Forças Armadas que Trump quer as mais poderosas do mundo (já são), terá influência no que se vier a passar na Ucrânia, em Taiwan ou em Israel.

Boa parte dos americanos não terá gostado das palavras de Trump (mas o federalismo vai atenuar o impacto de algumas políticas), e vários líderes mundiais também não (se bem que, a começar pelos europeus, muitos esperem que da teoria à prática vá alguma distância).

A primeira avaliação do nível de sucesso desta Presidência de Trump deverá acontecer em 2026. A 4 de julho, quando os Estados Unidos celebrarem 250 anos e se vir a relação com o mundo, e depois a 3 de novembro, quando o Congresso for a votos e o atual domínio do Partido Republicano tiver de ser revalidado. Mas há uma avaliação que se pode já fazer. Por muito que exista o excecionalismo de Trump, o que verdadeiramente conta é o excecionalismo americano. Existe desde os primórdios da República no século XVIII, reafirmou-se no século XX quando venceu as duas guerras mundiais e a Guerra Fria, confirma-se hoje em tantos domínios, das empresas às universidades, do poderio militar ao sonho americano que leva tanta gente a buscar lá um futuro.

Há dias, entrevistei Hamish McRae, que escreveu O Mundo em 2050. O título foi: “Não consigo imaginar o fim da liderança americana.”

Diretor-adjunto do Diário de Notícias

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