O trabalho é para trabalhar. Parece um ditado retirado de um almanaque antigo, mas foi uma frase que ouvi repetidamente em miúda e que, na altura, tratei de ignorar com a displicência própria da juventude. Ingénua, acreditava que o trabalho serviria para realizar sonhos, viajar, pagar contas sem dor de cabeça e, claro, viver melhor. Hoje, quem anda no mercado como freelancer percebe que a sentença continua viva e cruel: trabalha-se para trabalhar, não para viver.É curioso notar como a nova geração tem a coragem de dizer que não quer trabalhar tanto quanto a minha trabalhou. Não é preguiça, é inteligência. É a perceção de que a vida pode ser mais do que relatórios intermináveis e e-mails às três da manhã. Pessoas felizes produzem mais e melhor. O problema é que não há felicidade num trabalho que existe apenas para encher horas. Há, sim, um cansaço desgraçado, daqueles que não se curam com férias low cost em Benidorm nem com aulas de ioga online.A minha geração foi ensinada a medir o sucesso pelas conquistas profissionais: o cargo, a secretária com vista, o cartão de visita que parecia um troféu. Hoje, os mais novos encolhem os ombros perante essas medalhas de lata. Percebem que as oportunidades são curtas e que a tabela salarial parece escrita a lápis, com números invisíveis. Já no liceu se queixam das poucas perspetivas, dos ordenados mínimos e das rendas que não lhes permitirão sair de casa. No âmbito do programa nacional Mais Contigo, uma avaliação concluiu que 40% dos adolescentes apresentam sintomas de depressão e 12% correm risco de comportamentos suicidários. Alguém se dispõe a analisar e debater este estudo?Não admira que os índices de felicidade estejam em queda livre e que a falta de esperança se torne estrutural. Pergunta-se então: como mudar isto? E, ainda mais urgente, quem está realmente a pensar nisso? Onde estão os debates sérios que envolvem os mais novos e questionam como tornar o trabalho mais humano e entusiasmante?Com a tecnologia a substituir empregos a um ritmo assustador e a Inteligência Artificial a prometer fazer relatórios, diagnósticos e até discursos melhor do que os próprios políticos, a velha máxima de que o trabalho é para trabalhar já não se sustenta. As novas gerações sabem-no: a vida tem de ser mais do que bater ponto e pagar contas.Se o trabalho não servir para viver melhor, então não serve. Jornalista e escritora