Estado da Nação

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Ganhou o país. Porquê? Porque os eleitores portugueses disseram claramente que não estão disponíveis para dar mais poder ao partido de extrema direita que fez uma campanha galvanizada no resultado das eleições legislativas de maio passado. Ganhou o país porque há um claro entendimento de que o partido social democrata e o partido socialista são as estruturas políticas com credibilidade para o exercício da democracia. Sim, nas eleições legislativas o Chega teve uma vitória e, entretanto, os portugueses terão entendido que não é um partido, um líder, um conjunto de militantes para conferir dignidade ao governo local. Isto precisa de ter uma leitura nacional. O governo, ainda em estado de graça, governará, mal ou bem, as opiniões decerto dividir-se-ão, e o partido socialista terá agora um novo fôlego para fazer oposição que é sempre um exercício difícil mas altamente saudável. Onde fica o Chega? No mesmo registo que até agora, não tenhamos ilusões, mas com outra perspectiva sobre a sua força. O que quero dizer com tudo isto? Como cidadã, respirei fundo e pensei: ainda vamos a tempo. Podemos fazer outras análises, confirmar outras realidades, perceber as perdas do Bloco de Esquerda e da CDU e também as coligações feitas ou não feitas e o que estas prejudicam ou beneficiam outros. Mas, de momento, opto pela esperança de ver o desaire do oportunismo, populismo e de uma campanha de mentiras e insultos que o partido de Ventura nos brindou. Que seja o princípio do fim, é o que desejo. Não estou sozinha.

O fim não é um ponto final. é um recomeço. A política portuguesa, tantas vezes exausta e descrente, precisa de se reconciliar com o sentido de comunidade, com a ideia de que o país é um projeto comum e não um campo de batalha. A opção por uma certa moderação não apaga os medos nem as desigualdades, mas lembra-nos que há uma maioria que quer viver num espaço civilizado, onde as diferenças se discutem e não se gritam. Eu estou farta de berros. Talvez este resultado seja apenas um intervalo – breve, precário – antes de novas tempestades. Mas é também um lembrete de que a democracia só se sustenta se for cuidada, como uma casa antiga que precisa de mãos firmes e paciência. Continuo a acreditar que a política pode ser um lugar de serviço e não de raiva, de construção e não de destruição. É isso que espero dos próximos meses: que as palavras recuperem o peso da verdade e que o país encontre, de novo, o seu centro de gravidade.

Jornalista e escritora

Diário de Notícias
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