Não queremos ter desculpa 

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A foto que o DN publica hoje na primeira página é uma foto chocante. Foi publicada em primeira mão pela CNN e ninguém nos pode garantir que seja verdadeira. A história recente, aliás, está carregada de exemplos de manipulação que deixaram o jornalismo ficar mal. Mas então porque é que o DN a publica? Porque não temos a mínima dúvida da perseguição de que são vítimas os muçulmanos rohingya na Birmânia (análise deste conflito no link abaixo).

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A foto é chocante, mas ela revela que o terrorismo religioso não tem fronteiras, nem escolhe zonas do globo para estar em destaque. O jornalismo sim, faz opções pela proximidade, seja geográfica ou religiosa. Desta vez, fazemos a opção consciente de chocar os leitores, com uma foto do outro lado do mundo. Não significa que mudemos os nossos critérios editoriais e que passemos a publicar fotos de mortos na primeira página, sempre que o acontecimento noticioso tenha relevância.

No ano em que o secretário-geral das Nações Unidas quer que todos nós dêmos prioridade à paz, importa que não a desejemos apenas no nosso quintal. É lá longe, entre budistas e muçulmanos, mas é como cá, entre nacionais e estrangeiros. A foto diz-nos ainda mais, diz-nos que as crianças são as principais vítimas destes conflitos que não fazem sentido, num mundo que se deseja com cada vez menos fronteiras.

A foto de Aylan, a criança morta numa praia europeia, não difere em nada da foto de Mohammed, criança morta numa margem do rio que divide a Birmânia do Bangladesh. A nossa perceção de cada um dos conflitos é que é muito diferente. No que diz respeito ao drama dos refugiados que chegam do continente africano à Europa já não queremos saber porque se banalizaram as imagens e as notícias, enquanto em relação à perseguição na Birmânia nunca quisemos saber. É por isso que publicamos uma foto, que nos chega através da CNN, de um ponto muito distante em relação aos nossos interesses. Porque nos sentimos obrigados a não ter a desculpa de poder dizer que não sabíamos.

A capa do DN de hoje

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