Dois modelos

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Fez algum burburinho mediático, perante uma quanta generalizada indiferença por entre a população, mesmo a que frequenta redes sociais, o resultado medíocre dos portugueses num inquérito da OCDE às competências dos adultos, nomeadamente no que se refere à capacidade de ler textos menos simples ou de fazer cálculos para além de operações aritméticas elementares. A evidência de, na amostra, Portugal apenas estar acima do Chile provocou as reações habituais, entre a indignação e a relativização.

No caso da indignação, encontrámos algumas vozes que aproveitam estes momentos para dizer mal do Sistema Educativo português, como um todo, como se o fracasso fosse total e nada se aproveitasse nos últimos 50 anos.

O que está errado. Entre os relativizadores, temos principalmente gente com responsabilidades na desgovernação mais recente da Educação, que remete tudo o que corre mal para culpas alheias, só faltando mesmo dizer que tudo tem origem no facto de Afonso Henriques só saber assinar de cruz e mesmo assim mal feita. O que também está longe de estar certo.

Pelo meio, há uma outra posição, que é a de salientar que o mesmo país que produz tantos iletrados funcionais, também tem dado ao mundo gente excelente em várias áreas do Conhecimento, assim como não sei quantas universidades no ranking europeu ou mundial disto e daquilo, não esquecendo tantos premiados em certames internacionais de Artes, Ciências e Desportos.

O que não está errado, mas não explica a razão de um paradoxo que não chega a ser, pois nos demonstra como temos uma sociedade dual a tantos níveis, não sendo a Educação ou a Literacia exceções notáveis, muito pelo contrário. A excelência e a mediocridade, com um imenso hiato entre a base e o topo do desempenho, são marcas típicas de uma sociedade que não passa do combate retórico à desigualdade, não apenas económica.

Porque existem dois modelos de “políticas de desenvolvimento”, na Economia como na Educação. Num deles, procura-se que a maioria da sociedade experimente um progresso global, se possível elevando o desempenho dos “piores”, de modo a aproximarem-se dos “melhores”. Ao contrário do que algumas doutas teorias podem fazer crer, isso não acontece com políticas que apostam apenas em mecanismos de compensação ou maquilhando as situações de maior vulnerabilidade. Porque essas medidas são transitórias, paliativas, não deixando raízes.

No segundo modelo, aquele em que vivemos, o pretenso desenvolvimento é profundamente assimétrico, e o “topo”, os nichos de excelência (na Cultura, na Economia, na Educação, na Ciência, até no Desporto) estão cada vez mais distantes da realidade da maioria, do hoi polloi.

É um modelo que, por muitas boas intenções que se proclamem, abdicou de combater a crescente desigualdade. É o modelo dos 99% cada vez mais distantes do 1%.

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