A reunião do G20 na Indonésia decorreu de uma forma construtiva. Apesar da guerra na Europa, das tensões à volta de Taiwan, da existência de vários conflitos em diversas partes do globo, da rivalidade entre a China e os EUA e de outros desafios, os líderes presentes em Bali quiseram transmitir uma mensagem positiva. As discussões de grupo e as reuniões bilaterais foram intensas. A declaração aprovada foi engenhosamente trabalhada pelo presidente indonésio, Joko Widodo, à volta dos grandes temas que exigem uma cooperação económica global - a transição energética, o clima, as pandemias, a segurança alimentar, a fluidez do comércio internacional e das cadeias de abastecimento, a dívida pública dos países mais vulneráveis e a transformação digital..A preocupação de fundo foi a de manter a dimensão económica como o eixo central do G20. Mas a cimeira não podia ignorar o que se passa na Ucrânia. Assim, a questão ucraniana ocupou uma parte dos debates e foi incluída na declaração final, onde surge como uma preocupação de topo. No essencial, os membros do G20 sublinham ser inadmissível o recurso ou a chantagem às armas nucleares, e defendem o primado da resolução pacífica dos conflitos e os princípios da Carta das Nações Unidas. A maioria dos participantes exige que a investida termine, se aplique um cessar-fogo e se defina um acordo de paz duradouro para a região. O debate sobre esta crise mostrou claramente o isolamento político internacional em que Vladimir Putin colocou a Rússia. Mesmo quando a declaração final diz que existem outras maneiras de ver as causas do conflito, não houve hesitação em citar que a Assembleia Geral da ONU já havia condenado a agressão russa..O Presidente Volodymyr Zelensky, que tinha recebido um convite especial para uma intervenção por videochamada, percebeu a atmosfera existente na sala e, por isso, apresentou um plano de paz com uma dezena de pontos. É um plano coerente, que pode ser resumido assim: retirada das forças invasoras de todos os territórios ucranianos; punição dos criminosos de guerra; compensação dos danos causados à Ucrânia; realização de uma conferência sobre a segurança e a boa vizinhança naquela parte da Europa..É evidente que Putin não irá aceitar no futuro próximo qualquer discussão nessa base. Qual poderá então ser a evolução provável do conflito? E que devem fazer os aliados da Ucrânia? Pergunto assim porque não subscrevo a teoria delirante desta ser uma guerra entre a Rússia e os EUA, utilizando a Ucrânia como pretexto. Esta é uma invasão decidida por Vladimir Putin. Tem como vítimas o povo, a cultura e as aspirações democráticas ucranianas. Apregoar que é um confronto entre a NATO e o povo russo é fazer o jogo de Putin e da sua clique corrupta de oligarcas e de criminosos de guerra..O conflito deve evoluir no sentido do reforço político-militar da Ucrânia. Só desde 24 de fevereiro, a ajuda militar norte-americana já anda à volta de 18,2 mil milhões de dólares. Deve continuar, quer com artilharia de longo alcance e de última geração, quer ainda com o fornecimento de meios de defesa antiaérea. Do lado europeu, a assistência militar deverá atingir os 18 mil milhões, em 2023, no que respeita ao apoio humanitário e ao funcionamento da administração pública. Estes montantes são significativos. São, porém, indispensáveis para manter as capacidades combativas e administrativas da Ucrânia. E representam muito menos dinheiro que os mais de 55 mil milhões gastos anualmente com a controversa Política Agrícola Comum. E a Ucrânia já mostrou que sabe transformar esses fundos em vitórias contra os ocupantes..E as negociações de paz, são para quando? Dependem fundamentalmente da posição russa. Se tomarem a decisão política de se retirar - o que deveriam fazer já -, a Ucrânia poderá negociar uma retirada ordenada e o tipo de relações que deverão existir entre estes dois vizinhos. Infelizmente, não vejo no horizonte nenhum processo negocial virado para a paz. Nem mesmo para um cessar-fogo. Antes pelo contrário, os ucranianos têm de manter a pressão operacional sobre as forças invasoras durante todo o inverno, para evitar que elas aproveitem qualquer tipo de pausa para se reorganizarem ou se reabastecer. Mesmo no tempo da chuva e da neve, a contraofensiva ucraniana não pode ficar congelada.. Conselheiro em segurança internacional. Ex-secretário-geral-adjunto da ONU