Do desenvolvimento ao rigor orçamental

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Não se apresenta fácil conciliar o desiderato de um genuíno desenvolvimento económico - que implica, também, algum crescimento - com o objectivo de se implementar uma política de rigor das Finanças Públicas.

Em determinadas circunstâncias - nomeadamente, quando se está confrontado com uma situação de estagnação ou de recessão económica -, faz sentido, para um neo-keynesiano como o autor deste artigo, recorrer ao défice orçamental e, portanto, ao agravamento da dívida pública, com as consequências daí decorrentes, em termos de rating da dívida pública do país em causa e, por conseguinte, de aumento dos encargos financeiros com a sobredita dívida.

Talvez não venha a ser esse o caso da economia portuguesa, apesar de a situação económica previsível da economia europeia não se apresentar como sendo uma das mais favoráveis, como é do conhecimento geral.

Mas, não será fácil para Portugal obter uma taxa de crescimento do PIB, em 2025, particularmente elevada, tanto mais que a Europa não irá crescer significativamente e os principais parceiros do nosso país oscilarão entre a para-recessão e a recessão, propriamente dita.

E a Europa, com a guerra na Ucrânia, poderá conhecer uma situação difícil.

Dir-se-ia mesmo mais, que, se a Europa pretender fazer face à situação de guerra, nas presentes circunstâncias, não optando pela desonra de uma rendição da Ucrânia e tendo em conta o que já se conhece sobre o pró-putinismo de Trump, a decisão deveria passar por um reforço da Segurança da Europa, o que implicaria um endividamento da UE, optando, claramente, pela mutualização da dívida.

Claro está que se trataria de uma situação extrema em que a opção a realizar levaria à não-satisfação plena dos critérios ditados pelo rigor orçamental.

O próprio Relatório Draghi, ao apostar de forma tão decidida num acréscimo do investimento público europeu, implicaria a aceitação do princípio da mutualização da dívida e um certo agravamento da dívida europeia. O que, aliás, se compreenderia, dada a necessidade de combater o gap  de crescimento e de inovação que existe em relação aos EUA e à China.

Mas, em qualquer caso, importará não se correr o risco de um agravamento descontrolado da dívida europeia, pensando-se sempre na necessidade de, na medida do possível, se criarem sinergias na indústria (inclusive, na indústria da Defesa) e nos serviços europeus que, a prazo, fruto de um efeito multiplicador, permitam a ulterior obtenção de receitas fiscais que permitam reequilibrar as contas públicas europeias (agregadas e discriminadas por países), por forma a manter-se, a prazo, a credibilidade económica e financeira do “conjunto europeu”.

O endividamento, qualquer endividamento, tem sempre de obedecer a algumas “regras de controlo” que evitem o agravamento “explosivo” da dívida, por forma a criar irreversivelmente, a ideia de total irresponsabilidade de gestão das Finanças Públicas.

Na medida do possível, haverá sempre que tentar manter um justo equilíbrio entre uma situação de “crise-ajuda” provocada por um cataclismo qualquer ou, até mesmo, por uma guerra e o objectivo de manutenção de uma preocupação de rigor nas Finanças Públicas, com oscilações que não deverão ultrapassar os limites da sensatez.

E o mesmo poderá dizer-se do objectivo desenvolvimentista, que obriga a aceitar riscos despesistas, sem, todavia, se comprometer o essencial de uma política de gestão das Finanças Públicas.

A ideia de que jamais deverá haver défice orçamental é tão redutora como a de que o endividamento do Estado não deverá conhecer limites em caso de “crise aguda” com que, eventualmente, se venha a confrontar um país.

Entre a ortodoxia do rigor orçamental extremo e a ortodoxia do primado à “situação de crise” ou ao desiderato “desenvolvimentista” deve primar a “sabedoria do bom-senso”, evitando-se quer a “morte por ausência de acção determinada”, quer a “morte suscitada por excesso de intervenção”.

Nem mais, nem menos…


Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico

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