Dilemas e estratagemas à direita

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A candidatura de Carlos Moedas à Câmara Municipal de Lisboa apareceu como um brinde para todo o centro-direita. A começar pelo PSD, que teve um resultado desastroso há quatro anos, e a terminar no CDS, que não tinha como repetir a tareia dada aos sociais-democratas nas últimas autárquicas e precisava de justificar a cedência do cabeça-de-lista desta aliança. Moedas é igualmente o melhor trunfo para a direita dos pequenos partidos que ganha a hipótese de fazer parte de uma candidatura que abre caminho para uma vitória, que parecia impossível antes do ex-comissário aceitar o desafio de Rui Rio.

É a partir deste ponto que se determina quem tem como prioridade construir uma alternativa ao governo do PS, em Lisboa este ano e no país em 2023, e quem prefere dizer uma coisa e fazer outra. Espanta, por isso, que quem enche a boca a todo o momento contra o socialismo, montando outdoors a pedir apitadelas e retuites para quem esteja "farto do socialismo", não se tenha mostrado capaz de dar o passo necessário para, como diz, "tirar da câmara o PS que há 14 anos a governa e o actual presidente que há seis anos sem ambição, com demasiada burocracia e lógicas clientelares de exercício de poder".

Só há uma forma de tirar da presidência da câmara alguém que se recandidata, é ter uma candidatura que fique em primeiro lugar. Não funciona a lógica parlamentar que deu origem à geringonça. Estará o partido Iniciativa Liberal (IL) convencido que pode ultrapassar pela direita a candidatura de Carlos Moedas e chegar-se à frente para vencer Fernando Medina? Ninguém é suficientemente louco para acreditar nesta possibilidade, pelo que é legitimo concluir que, afinal, João Cotrim Figueiredo e Miguel Quintas não entendem que a prioridade seja "tirar da câmara o PS que há 14 anos a governa".

O IL tem todo o direito de decidir o seu próprio destino, mas deve atender ao que está implícito na resposta de Carlos Moedas: "Somos os únicos que podemos derrotar a governação de Fernando Medina. Cada um de nós, lisboetas, tem a responsabilidade desta escolha." Deve atender a esta resposta, porque é evidente que haverá uma pressão muito forte junto dos eleitores liberais para votarem "útil" em Moedas e isso diminui as hipóteses de sucesso da candidatura de Miguel Quintas. Mas, os poucos ou muitos votos que possam ser destinados à candidatura do IL serão sempre votos a ajudar a uma possível vitória do Partido Socialista.

Há um segundo erro nesta aposta liberal: abre uma brecha no cordão sanitário que podia ser montado à volta do Chega e que permitiria iniciar a construção de uma maioria parlamentar para substituir a maioria de esquerda existente. O medo de deixar André Ventura a falar sozinho, pensando que com isso lhe dão mais força, mostra que o IL faz exatamente o que os partidos tradicionais costumam fazer, depois de justificar esta decisão aos seus militantes dizendo que "seria certamente mais fácil aceitar o jogo político tradicional". Veja-se, por exemplo, o que vão fazer os partidos à esquerda do PS: Bloco de Esquerda e Partido Comunista já fizeram saber que terão candidaturas próprias, deixando a Medina a responsabilidade de derrotar Moedas, porque, tal como o IL, BE e PCP têm outro desígnio.

Se o IL repetir a votação conseguida por Tiago Mayan Gonçalves no concelho de Lisboa, terá um bom resultado e deverá eleger um vereador, mas será muito provavelmente para estar na oposição, numa autarquia socialista. É legítimo que pensem que isso é o melhor para o partido. Tão legitimo como os eleitores de centro-direita os castigarem nas urnas, para fazerem o que eles defendem que tem de ser feito, derrotar o PS.


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