Depois de uma tragédia, o medo pode tomar conta das crianças

Dois dias depois da tragédia com o elevador da Glória, uma criança recusou-se a ir ao meu consultório utilizando o elevador, e preferiu subir as escadas até ao 12.º andar. “Tenho medo de que o elevador caia”, justificou.
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Esta tragédia suscita, naturalmente, emoções mais desagradáveis, não apenas em quem a vivenciou na primeira pessoa, mas também naqueles que a presenciaram, intervieram ou tomaram conhecimento. É o caso desta criança, e de tantas outras, que sente agora medo, tristeza, ansiedade… e, por isso, evita diversas situações. 

Como podemos nós, adultos, ajudar as crianças a lidar com estes medos? Ficam aqui algumas dicas. 

1. Acolher o medo sem julgamentos

• Reconheça e valide aquilo que a criança está a sentir (“percebo que estás assustado, foi um acidente muito triste”).

• Evite frases como “não tens razão para ter medo” – a criança irá sentir-se invalidada e incompreendida e a sua ansiedade pode aumentar. 

2. Restabelecer a confiança nos transportes

• Explique, com uma linguagem adaptada à idade, que os diversos meios de transporte têm sistemas de segurança. Pode usar um exemplo mais próximo, como as revisões e inspeções que são feitas aos automóveis.

• Use exemplos positivos: “Lembras-te da última vez que fomos de carro e correu tudo bem?”.

3. Encoraje a expressão e a regulação emocional 

• Ajude a criança a nomear o que sente: medo, tristeza, ansiedade, confusão…

• Ensine algumas técnicas simples de respiração ou visualização para momentos de maior ansiedade.

4. Incentive a expressão criativa para lidar com a emoções 

• Incentive a criança a desenhar, brincar ou contar histórias sobre o que sente, podendo usar fantoches para simular situações seguras com os diversos meios de transporte. 

5. Exponha a criança de forma gradual às situações receadas

• Comece com trajetos curtos e familiares.

• Dê à criança alguma sensação de controlo (por ex., escolher o lugar onde se senta, levar um brinquedo de conforto). 

6. Ambiente seguro e previsível

• Mantenha rotinas estáveis e mantenha-se emocionalmente disponível.

• Proteja a criança, evitando a exposição excessiva a conversas ou notícias sobre o acidente.

7. Peça ajuda especializada, se necessário 

• Se o medo da criança começar a ser muito intenso, frequente e duradouro, interferindo com as suas atividades de vida diárias, peça ajuda a um psicólogo.

Psicóloga clínica e forense, terapeuta familiar e de casal

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