Ensina o Dicionário Houaiss que colonização é o “acto ou efeito de colonizar”. E, ensina também, que colonizar, em sentido figurado, significa “alastrar-se por, propagar-se, invadir”.Ora, parece que a vida política portuguesa está a ser colonizada por um certo discurso que, de tão falsamente simplista, invade o pensamento de muitos que, com ligeireza, julgam poder cavalgar, em proveito próprio, os sentimentos mais instintivos e irracionais de uma parte da população.Merece reflexão que num país que tem cerca de dois milhões de pobres (mais de quatro milhões se não considerarmos as prestações sociais), que não tem casas para os seus habitantes, que tem uma administração pública disfuncional e uma economia que só funciona porque pelo menos um milhão e setecentos mil estrangeiros (dados oficiais da segurança social) todos os dias a fazem funcionar, apesar disto no topo da agenda estão os temas que sabemos.A direita mais radical construiu uma agenda à volta da imigração, dos ciganos, dos apoios sociais públicos e da afirmação de um certo nacionalismo/localismo absolutamente fora de época.Curioso, triste e sobretudo preocupante é que para responder a uma agenda marginal, aqueles que tinham a obrigação histórica de a combater, acabem, por acção, a dar-lhe cidadania plena e credibilidade, em nome de uma certa vertigem imediatista. Ou seja, a deixarem-se invadir, voluntariamente auto conduzidos à condição de colonizados.A uma questão imigratória que negligentemente ninguém antecipou, responderam com uma lei sobre a nacionalidade. À incapacidade de enquadrar os que fazem funcionar o turismo, a construção ou a agricultura, respondem com normas que vão abranger judeus e descendentes de portugueses. Portugueses que a nossa endémica pobreza obrigou a emigrar. E, ao colocarem os ciganos na agenda apenas estão a diabolizar o que é diferente e não a resolver qualquer problema estrutural. Ou alguém ignora que a generalidade dos cidadãos de etnia cigana são cidadãos portugueses com nacionalidade originária?Nos últimos dias, qual cereja no topo do bolo, o discurso evoluiu para a salazarista expressão “o meu partido é Portugal”, a lembrar o discurso de Oliveira Salazar de 1930 "abandonar uma ficção -o partido-, para aproveitar uma realidade- a associação." Como se não bastasse vai-se propagando a ideia de que se impõe uma revisão constitucional, não se discutindo já a sua necessidade ou objecto, antes e só, o seu alcance revogatório.A colonização avança, de facto. A submissão à agenda populista, também.A cidadania regride e as liberdades, nunca definitivamente garantidas, ficam mais ameaçadas.Enquanto isso o estado de direito e o consequente primado da lei parecem ter saído do palco. Em Portugal e no mundo.Vamos todos achar-lhe o prejuízo.