China: Carta aberta ao Sr. Primeiro-Ministro, Luís Montenegro

Publicado a

Há muito tempo que o ensino superior em Portugal enfrenta um desafio de crescimento e visibilidade a nível global. No entanto, não é apenas a excelência académica que precisamos promover; é também a nossa capacidade de estabelecer laços internacionais que nos permitam exportar a nossa oferta educacional para mercados globais. Exportar é internacionalizar e basta ler os números das entradas deste ano, conjugar com a pirâmide etária e mais uns pozinhos e teremos tudo para perceber que temos mesmo de internacionalizar e muto. Um dos mercados mais promissores para a educação superior portuguesa, onde o ISCTE-IUL tem trabalhado de há muito, e que tem sido sucessivamente ignorado, é a China. Temos nesse mercado um doutoramento a funcionar há 15 anos em parceria com universidades chinesas.

A China, não é preciso lembrar, é uma potência mundial em todos os sentidos, incluindo a educação. Com uma população superior a 1,4 mil milhões de pessoas e um sistema de ensino altamente competitivo, é natural que este país represente uma oportunidade única para as instituições de ensino superior de todo o mundo, incluindo as portuguesas. Resumindo, o tamanho da oportunidade mede-se desta forma: são 140 deles para cada um de nós. Queremos mercado? Ele existe. Para conseguirmos realmente abrir portas e ter uma presença significativa neste mercado em mestrados, é necessário que a China reconheça oficialmente os nossos programas de mestrado de 60 ECTS (European Credit Transfer System). Infelizmente, o que vemos é que, apesar de vários esforços, a situação permanece inalterada e Portugal continua à margem.

O que está em causa não é apenas uma questão burocrática ou administrativa. Trata-se de uma questão estratégica (e diplomática) que afeta diretamente o futuro da educação superior em Portugal. Os mestrados de 60 ECTS, frequentemente descritos como mestrados profissionais de um ano, representam uma parte substancial da oferta do ensino superior em muitas universidades e escolas de negócios portuguesas. No entanto, até hoje, esses programas não têm a mesma aceitação ou reconhecimento na China que os de outros países europeus, como Espanha ou França e apenas para exemplificar, cujos acordos bilaterais permitem, via CSCSE (China Service Center for Scholarly Exchange), reconhecerem os programas destes países. O resultado? As universidades espanholas e francesas, com acordos umbrella bem estabelecidos, podem exportar os seus programas de mestrado de 60 ECTS para a China, ao passo que os programas portugueses ficam à margem.

Esta assimetria é inaceitável. No caso de Espanha e França, até as instituições mais pequenas, muitas vezes longe da qualidade académica minimamente aceitável, conseguem garantir que os seus mestrados de 60 ECTS sejam aceites pela CSCSE e pelo Ministério da Educação da China. O que significa que, em termos práticos, estas universidades estão a conseguir acesso a um mercado vastíssimo, enquanto as nossas instituições de ensino superior permanecem à espera de uma simples atualização no protocolo bilateral entre os dois países.

O que propomos é simples e urgente: uma palavra que desbloqueie este assunto de uma vez e uma celeridade na atualização do protocolo bilateral sino-português (já está, de resto, nos dois ministérios a versão updated) para garantir que os mestrados de 60 ECTS sejam

reconhecidos pela CSCSE e pelo Ministério da Educação da China. É preciso que as autoridades portuguesas, nomeadamente o Ministério dos Negócios Estrangeiros e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, tomem as rédeas desta questão e estabeleçam um diálogo claro e eficaz com as autoridades chinesas. O processo não é difícil de implementar, pois outros países europeus já o fizeram. A simples adenda ao protocolo atual e um esforço conjunto dos dois ministérios podem desbloquear um mercado educacional vastíssimo, trazendo benefícios tanto para as nossas universidades como para os estudantes que procuram uma educação de excelência.

Este é um passo fundamental para internacionalizar o ensino superior português. E está nas suas mãos, senhor Primeiro-Ministro, desbloquear este assunto na sua visita a começar a 8 de Setembro de 2025 à China. Portugal e as Instituições de Ensino Superior portuguesas agradecem. Eu pessoalmente, e os meus colegas envolvidos nesta temática, que procuramos resolver há mais de 2 anos, agradecemos também.

Diário de Notícias
www.dn.pt