Domingo, 16 de Novembro, foi a vez do Chile escolher entre a Direita e a Esquerda. Tal como a maioria dos países latino-americanos, o Chile tem um regime presidencialista e o presidente em exercício é Gabriel Boric, que chefia o governo mais à esquerda desde Salvador Allende. Boric encabeça uma esquerda eco-feminista, semi-utópica e woke-friendly, levada ao poder pelo “estallido social” de 2019, um conjunto de manifestações de rua desencadeadas por estudantes em fúria contra o aumento do custo dos transportes.Mas Boric teve um grande desaire em 2022, quando tentou fazer aprovar uma nova constituição e perdeu o referendo popular. Assim, continuou em vigor a constituição saída do plebiscito de 1980, no tempo do governo militar de Augusto Pinochet e da sua “democracia protegida”, que a partir da saída do general-presidente em 1990 se foi democratizando.No passado domingo contaram-se os votos. Dos oito concorrentes, nenhum alcançou a maioria absoluta, pelo que haverá uma segunda volta a 14 de Dezembro entre os dois primeiros: a candidata comunista, Jeannette Jara, com 26,8%, e o candidato do Partido Republicano, José António Kast, com 24%.Kast, que os media definem como “ultra-direitista” e que já tinha concorrido às eleições presidenciais de 2017 e 2021, declarou depois da vitória de Trump: “As nossas ideias já ganharam nos Estados Unidos, na Itália, na Argentina […] e no Chile também vão ganhar.”Talvez venha a ter razão. Kast tem 59 anos, é licenciado em Direito e casado com a advogada Maria Pia Adriasola. Pertencem os dois ao movimento católico Schoenstatt. Maria Pia é uma feminista que não acredita em quotas, é crítica do casamento homossexual e só admite o aborto em caso de violação, má-formação do feto e risco de vida para a mãe.Grande parte dos media, ainda que reluctante, dá Kast como vencedor na segunda volta: primeiro, porque, com 24%, ficou mais perto de Jara do que se esperava; depois, porque, dos seis candidatos excluídos, dois, Johannes Kaiser (13,9%) – o Milei chileno, à direita de Kast – e Evelyn Matthei (12,5%) – da “direita tradicional” –, já felicitaram Kast, apelando aos respectivos seguidores para que votem nele.Bastaria que os eleitores de Kaiser e Matthei votassem em Kast para que Kast superasse os 50%, mas embora seja improvável que a candidata esquerdista ultrapasse Kast, a verdade é que não há “donos dos votos”. Quanto ao terceiro classificado na primeira volta, o populista Franco Parisi, líder do Partido da Gente, com 19,7%, ainda não se pronunciou. Jara desafiou-o a apoiá-la para “conter a ultra-direita”, mas Parisi não reagiu, ou não tivesse ele concorrido com o slogan “Ni facho ni comunista”. Perante a alternativa entre os dois “extremos”, Parisi propõe “que eles, os apurados para a final, convençam os eleitores”.De qualquer forma, depois da vitória de Rodrigo Paz na Bolívia e de Milei na Argentina, a “onda rosa” parece atenuar-se na América do Sul. E se o Chile se resolver pela Direita, haverá mesmo um empate: seis (Argentina, Bolívia, Equador, Paraguai, Peru… e Chile) para a Direita; e seis (Brasil, Colômbia, Guiana, Suriname, Uruguai e Venezuela) para a Esquerda.E, desta vez, a Direita não vem por golpes ou ditaduras militares – vem pelas urnas, pelo voto do povo. É isso que custa mais à Esquerda e, sobretudo, à comunidade jornalística e comentadora.Politólogo e escritor. O autor escreve de acordo com a antiga ortografia