A nova proposta de cessar-fogo para o Líbano, apresentada pelo representante dos Estados Unidos junto do lado libanês, é uma oportunidade para pôr fim à violência naquele país e permitir que os civis israelitas regressem às suas casas no norte. O Sul do Líbano regressaria às soluções da Resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas nº 1701 de 2006, na qual está estipulado que entre a fronteira libanesa-israelita e o rio Litania (30 km dentro do Líbano) as únicas forças armadas presentes serão pertencentes ao exército libanês regular, controlado pelas forças da Força Interina das Nações Unidas no Líbano..Como seria de esperar, a destruição e a matança deveriam parar, e algum tipo de normalidade regressaria à vida quotidiana de ambos os lados..No entanto, também é normal colocar a questão: o que foi conseguido durante a mais recente ronda de conflito que começou apenas um dia depois de membros do Hamas terem atacado o sul de Israel? Do ponto de vista israelita, os ataques com mísseis do Hezbollah, que se intensificaram a partir de Outubro do ano passado, cessariam. Além disso, os militares israelitas acreditam que o Hezbollah está numa situação muito pior após os combates, com falta de comandantes, armas, financiamento e infra-estruturas. Os danos infligidos não só ao Hezbollah, mas também ao instável governo central do Líbano e a todos os cidadãos daquele país em crise, são enormes e não é claro como será a situação política interna num futuro próximo. Muitos desafios aguardam ao virar da esquina e muitas questões virão ao de cima, mesmo sem a participação de Israel..Com a posição do Hezbollah enfraquecida, alguns dos outros participantes políticos no palco interno em Beirute tentarão certamente beneficiar dela. É sabido que qualquer alteração no frágil equilíbrio de poderes naquele país pode resultar num acontecimento totalmente inesperado. Este equilíbrio foi no passado fortemente influenciado pelo apoio iraniano ao Hezbollah e serviu como fornecimentode tudo o que era necessário para manter a posição militar dominante daquela organização política e militar xiita. Depois do conflito atual é óbvio que as coisas não vão voltar à situação anterior, e o desconhecimento é total sobre quem e como se irá criar a nova situação..O Irão, por si só, continuará a enviar mensagens fortes contra Israel e os EUA, mas terá limitações na criação de alterações no terreno. As sanções económicas são muito preocupantes para aquele país e o potencial ataque israelita aos campos petrolíferos poderá ter consequências muito graves. Além disso, envolver mais países no conflito com Israel não serviria bem o futuro iraniano (cada míssil disparado contra Israel tem de sobrevoar a Jordânia ou a Arábia Saudita)..O sofrimento das pessoas no Médio Oriente é agora mostrado em tempo real na televisão e nas redes sociais e ninguém no mundo pode afirmar que isto não era conhecido, como alguns outros conflitos (Sudão, por exemplo). Este facto irá influenciar a opinião pública em algumas superpotências, cujas lideranças tentarãodecididamente assumir o papel de pacificadoras..Os preparativos do plano estão em curso e até o presidente eleito, Donald Trump, está envolvido. Já aprovou o projeto, fazendo com que parecesse a sua primeira contribuição para a paz no mundo, como prometeu durante a campanha pré-eleitoral. Contudo, o que está a acontecer agora nunca seria possível sem a participação ativa de Israel. Alguns analistas políticos dizem que, se o plano for aceite, servirá de presente dado por Jerusalém ao recém-eleito presidente dos EUA. Porquê? Porque o governo israelita sempre apoiou Donald Trump, esperando muito dele, ainda mais do que o mundo árabe (que deveria assinar tratados de paz com Israel) alguma vez concordará (anexações de partes da Cisjordânia)..No entanto, nem tudo é assim tão negro. O acordo de cessar-fogo no Líbano terá de influenciar também a situação na Faixa de Gaza. Este será o momento que poderá dar motivos a Israel e ao Hamas para também aderirem ao cessar-fogo. O Hamas tentaria trocar os reféns pela sobrevivência da organização e Israel declararia a vitória e tentaria manter em aberto a possibilidade de entrar na Faixa de Gaza caso os ataques ao seu território fossem retomados. Parece quase impossível, mas os interesses dos lados em conflito podem, por vezes, encontrar-se inesperadamente algures. Existem muitos elementos que podem influenciar as decisões israelitas no atual conflito, e um dos mais importantes é a mudança em Washington. O cessar-fogo em Gaza poderá ser mais um contributo para Donald Trump, organizado para reforçar a sua posição antes de tomar a Casa Branca a 20 de Janeiro..Até a destruição tem os seus próprios limites e alguém pode transformar o seu fim no sucesso, necessário a todos no Médio Oriente. Convém não esquecer que cada pessoa naquela região tem a sua própria opinião pública, que tem de ser positiva para se manter “politicamente vivo”..Investigador do ISCTE-IUL e antigo embaixador da Sérvia em Portugal.