Cardinal - pensamento estratégico para a mobilidade na AML

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O debate sobre os sistemas de mobilidade das áreas urbanas do país - e destacadamente da Área Metropolitana de Lisboa - está na ordem do dia. Importa assegurar que esse debate seja esclarecedor, clarificando os pressupostos em que assentam as opções e não abdicando de uma visão de conjunto para a mobilidade metropolitana.

Temos de pôr o dedo na ferida e reconhecer que os dados oficiais sobre as deslocações estão desajustados. O Inquérito à Mobilidade promovido pela AML remonta a 2019; e os Censos 2021 refletem o contexto da crise pandémica. Ambos ignoram o aumento populacional, os novos fluxos migratórios ou a gratuitidade dos passes metropolitanos para jovens promovida pelos últimos Governos.

Segundo os dados dos TML, do Metropolitano de Lisboa e das concessionárias das autoestradas da AML, vemos hoje uma aparente contradição: ao mesmo tempo que batemos recordes do número de passageiros em transporte público, o número de automóveis em circulação cresce, representando 60% das deslocações dos fluxos casa-trabalho-casa.

Para promover a alteração do meio de transporte preferido - do automóvel individual para o transporte coletivo - é preciso ir ao nervo da questão: a AML precisa de ter uma rede coesa de eixos de Transporte Coletivo em Sítio Próprio (TCSP), ajustada aos novos padrões de deslocação, que assegure aos cidadãos um elevado nível de previsibilidade, regularidade e velocidade.

Estes princípios encontram-se vertidos no Plano de Mobilidade Urbana Sustentável (PMUS) de Oeiras, apresentado em 2023, que consagra a visão do que designamos por Cardinal: um conjunto de quatro eixos de TCSP que atravessam o concelho e que estruturam a ligação à Área Metropolitana, unindo-se à rede de transportes existente.

Mapa do Cardinal

O Cardinal integra a linha de comboio de Cascais, operada pela CP. Apesar de esta já existir, é manifesto que a oferta disponibilizada não se coaduna com as necessidades de hoje, exigindo uma profunda reformulação do seu funcionamento.

A este eixo transversal, conjuga-se o da autoestrada A5, que atravessa o território e que é paradigmática das deficiências na mobilidade metropolitana: ano após ano, são medidos recordes no congestionamento de tráfego, mas é sucessivamente adiada a sua reconversão numa autoestrada urbana, desde logo com implementação de um corredor Bus Rapid Transport (BRT) ao longo do seu traçado, que aumente a eficiência do transporte público nas deslocações entre Cascais, Oeiras e Lisboa.

O Cardinal tem também dois eixos longitudinais. A ocidente, Oeiras está a trabalhar na reativação do SATUO, de forma a ligar as linhas da CP de Cascais e de Sintra, num percurso entre as estações de Paço de Arcos e de Massamá/Barcarena. Na margem direita do Jamor, passará a existir o novo LIOS - Transporte Rápido Lisboa/Oeiras, em BRT, partindo do Terminal de Algés, e onde se vão cruzar os passageiros da linha da CP de Cascais, da 4.ª Travessia do Tejo, entre Algés e a Trafaria, da ligação fluvial entre duas margens e do futuro prolongamento do Metro de Lisboa.

No seu todo, o Cardinal traduz uma visão clara sobre a forma de construir uma rede de transportes metropolitana que funciona. Sem purismos de limitar as opções à ferrovia pesada, nem escolhendo a utopia de criar de base uma nova rede, o que demoraria anos a implementar e investimentos muito mais onerosos. O Cardinal desenvolve a noção estratégica de criar ligações onde elas são necessárias, aproveitando o que já está feito, potenciando o desenvolvimento de toda a rede, ao mesmo tempo que propõe soluções de implementação rápida, trazendo o futuro para o quotidiano presente das pessoas.

Presidente do Conselho de Administração da Parques Tejo

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