A política portuguesa vive, por estes dias, uma espécie de suspense silencioso. À superfície, tudo parece calmo: os partidos cumprem o ritual das campanhas locais, os candidatos multiplicam promessas de proximidade, e os eleitores mantêm o habitual ceticismo. Mas sob essa camada de normalidade, há uma tensão que não se pode ignorar. As autárquicas de 2025 são mais do que uma disputa por juntas e câmaras - são um teste à saúde democrática do país e à legitimidade do Governo de Luís Montenegro.O poder local é, por definição, o mais próximo do cidadão. É ali que se sente, sem filtros, o impacto das políticas públicas, a eficácia da gestão, a presença - ou ausência - do Estado. Por isso, as autárquicas funcionam como um sismógrafo político: captam os tremores antes dos abalos maiores. Num contexto de governação minoritária, com o PSD a tentar consolidar uma base de apoio instável, os resultados destas eleições podem redefinir o equilíbrio de forças para os próximos anos. Se o PSD perder terreno, o Governo sairá enfraquecido; se ganhar, reforçará a sua capacidade de negociação e o seu peso institucional.O mesmo poderá dizer-se em relação aos partidos da oposição. O PS, ainda a digerir a derrota nas legislativas, aposta em manter o domínio autárquico como forma de resistência. O Chega tenta romper o cerco institucional e conquistar terreno onde a indignação se transforma em voto. E os partidos emergentes, da Iniciativa Liberal ao Livre, procuram afirmar-se como alternativas viáveis, mesmo em freguesias onde a política se decide à mesa do café.Mas o que está verdadeiramente em jogo é a confiança. Confiança nas instituições, nos representantes, na capacidade do sistema político de responder aos desafios reais: habitação, mobilidade, saúde e educação. A descentralização, tantas vezes prometida e adiada, continua a pairar como promessa não cumprida. E enquanto isso, as câmaras lutam com orçamentos apertados, burocracias labirínticas e uma crescente exigência dos cidadãos.Estas autárquicas são também um teste à maturidade democrática dos portugueses. Votar local é, muitas vezes, votar com o coração - pelo presidente que resolve, pelo vereador que atende, pela obra que se vê. Mas é também votar com a razão: pelo projeto, pela visão, pela capacidade de transformar o território. E é aí que o jornalismo tem um papel crucial - separar o ruído da substância, escrutinar promessas, revelar intenções. Economia está a abrandarO Conselho das Finanças Públicas lançou esta semana um alerta que não pode ser ignorado: o crescimento económico previsto para 2025 foi revisto em baixa, para uns tímidos 1,9%. Num país que ainda tenta capitalizar os fundos do PRR e recuperar da travagem brusca da pandemia, este número é mais do que um indicador técnico - é um sinal de que algo não está a funcionar.A execução do Plano de Recuperação e Resiliência continua lenta, os investimentos públicos patinam em burocracias, e os privados hesitam perante um cenário de instabilidade política. As exportações, que sempre foram motor da economia portuguesa, ressentem-se da desaceleração global e da ausência de uma estratégia comercial robusta. E o consumo interno, pressionado pela inflação e pela subida dos juros, já não consegue compensar.O Governo fala em reformas estruturais, mas o país precisa de ação concreta. A transição energética, a digitalização da administração pública, a requalificação da força de trabalho - tudo isso exige mais do que planos: exige execução, coragem e visão. E exige, acima de tudo, que se olhe para a economia não como um gráfico, mas como um sistema vivo, feito de pessoas, empresas e territórios.Se o abrandamento continuar, o custo político será inevitável. E aí, voltamos ao ponto de partida: a confiança. Sem ela, não há crescimento que resista. E sem crescimento, não há margem para o erro.