As polémicas no caminho do primeiro Óscar trans
Karla Sofia Gascón devia estar na reta final da promoção de Emilia Pérez, o filme de Jacques Audiard que ainda lhe pode garantir um lugar na história ao ser a primeira atriz trans a ganhar o Óscar. Em vez disso, a atriz espanhola foi afastada pela Netflix da campanha de promoção do seu filme - o seu rosto foi mesmo apagado dos cartazes - e viu Audiard distanciar-se do que considerou um comportamento “imperdoável”.
Mas afinal em que é que consistem os tweets polémicos da atriz que a ditadura do politicamente correto impede de serem explicados em várias publicações sobre esta polémica? Vencedora do prémio de Melhor Atriz em Cannes ,em maio de 2024, pelo seu papel de traficante de droga mexicano que muda de género no thriller musical Emilia Pérez, Gascón depressa percebeu que com a fama vem o escrutínio. E uma simples pesquisa na sua conta da rede social X chegou para encontrar comentários ofensivos sobre os muçulmanos, com a atriz a acusar o Islão de ser “um foco de infeção para a Humanidade”, sobre a China, quando na pandemia escreveu que “a vacina chinesa, para além do chip obrigatório, vem com dois rolinhos primaveras”, sobre George Floyd, o afro-americano cuja morte por um polícia branco gerou uma onda de protestos e que descreveu como “vigarista toxicodependente”, ou sobre os próprios Óscares, tendo descrito a diversidade da cerimónia de 2021 desta forma: “Não sabia se estava a assistir a um festival afro-coreano, a uma manifestação do Black Lives Matter, ou ao 8M [manifestação do Dia da Mulher].
Gascón pediu desculpas por estes tweets do passado e a “dor” que possam ter causado, mas é difícil acreditar no seu arrependimento quando ainda há dias voltou a ser notícia por ter criticado a equipa de redes sociais que trabalha com a brasileira Fernanda Torres, também nomeada para o Óscar de Melhor Atriz pelo seu papel em Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, acusando-a de tentar “destruir-me a mim e a Emilia Pérez”. Palavras que mais tarde disse não serem um ataque a Fernanda Torres mas sim “à toxicidade e discurso de ódio violento nas redes sociais”.
A menos de um mês da entrega dos prémios da Academia, poucos acreditam que a estratégia da Netflix de “apagar” a protagonista e centrar a campanha em Zoë Saldaña, nomeada para Melhor Atriz Secundária, renda mesmo o Óscar de Melhor Filme a que Emilia Pérez era um dos favoritos.
Quanto a Karla Sofia Gascón, dificilmente se tornará a primeira mulher trans a vencer um Óscar - e não tem nada a ver com uma questão de género.
Editora-executiva do Diário de Notícias