Alojamento Local fora da equação

Há muito tempo que não assistíamos a um consenso de tal forma alargado contra uma medida, quanto aquele a que estamos a assistir relativamente ao programa Mais Habitação apresentado pelo governo, que pretende (a todo o custo) aumentar a oferta de imóveis para habitação, simplificar o licenciamento, aumentar o número de casas no mercado de arrendamento, combater a especulação e proteger as famílias.

De especialistas em matéria de habitação, a autarcas, partidos políticos, ordens profissionais, associações, economistas, proprietários, agentes económicos e trabalhadores, todos parecem unânimes em duvidar do sucesso deste programa, apesar de uma ou outra medida até fazer sentido.

Não me vou deter na questão do ataque que é feito ao direito de propriedade, no caso do arrendamento coercivo de casas devolutas, que também daria "pano para mangas", mas vou centrar-me, sim, no ataque, este de morte, que se quer fazer ao Alojamento Local (AL).

Não posso deixar de reconhecer que o problema da habitação é um dos mais graves que atravessamos a nível social, e por essa mesma razão decidiu agora o governo apresentar um novo plano de ataque chamado Mais Habitação, como já referi. Os objetivos, também já referidos e meritórios, não podem ser, nem serão alcançados com a inexistência do AL. Não se pode aceitar que o Estado queira sacrificar uma atividade económica e transferir para a esfera dos particulares uma responsabilidade que, em grande parte, é sua.

"Não se pode aceitar que o Estado queira sacrificar uma atividade económica e transferir para a esfera dos particulares uma responsabilidade que, em grande parte, é sua."

De facto, entre as mais graves medidas do Mais Habitação estão, precisamente, aquelas que são dirigidas diretamente à atividade de AL, como a suspensão de novas licenças (exceto zonas rurais), fazendo com que o país seja uma vasta área de contenção, a criação de uma contribuição extraordinária sobre o AL, a caducidade das licenças em qualquer caso de transmissão e a possibilidade de o condomínio pôr termo às licenças emitidas sem a sua aprovação.

Consegue-se, assim de uma assentada, aniquilar o AL em atividade, assim como aquele que pudesse vir a existir. Se isto não é uma sentença de morte a toda a atividade, não sei o que será.

E estas medidas são tão injustas quanto injustificadas, havendo uma série de mitos à volta do AL, praticamente desde o dia em que "nasceu".

Dizem ser atividade de grandes empresários, quando a maioria são micro e pequenas empresas, muitas das vezes familiares e que têm no AL o seu único sustento.

Dizem que é o causador dos preços altos das casas e que retira casas à habitação, quando se esquece uma lei que veio liberalizar rendas e despejos, e quando os imóveis onde se instalaram não estavam sequer afetos à habitação, mas sim desocupados e degradados.

Dizem que se quer baixar o preço das casas, principalmente em Lisboa e Porto, quando 70% do AL está fora destes centros urbanos.

Dizem que há demasiados AL, quando, por exemplo, em Lisboa, dois em cada três estabelecimentos não têm atividade (registos fantasma), porque não dão baixa da atividade, com receio de perderem os registos.

Dizem que causa muita perturbação quando há diminuta litigância nesta matéria.

Dizem que contribui para o degradar dos locais quando muitos dos edifícios foram reabilitados pelo AL e as zonas ficaram mais seguras por força das dinâmicas de desenvolvimento criadas pelo AL.

Dizem, dizem, dizem... é assim que tomamos decisões? Não teremos de estudar a realidade e de a conhecer de facto para então se fazerem as adequadas escolhas?

Todos temos um papel a desempenhar e o do Estado é reabilitar o seu património e colocá-lo no mercado, construir habitação, criar apoios ao arrendamento, criar incentivos fiscais, simplificar e agilizar processos de licenciamento, mas não pode beneficiar do empreendedorismo, do suor e da boa-fé dos empresários para depois penalizar fortemente uma atividade que tanto tem dado à nossa economia e às nossas pessoas, retirando toda a confiança num Estado que deve respeito à iniciativa privada, e que nela tem uma importantíssima fonte de riqueza.

Menos AL levará a menos economia, e menos economia nunca levará a mais e melhor habitação. É por tudo isto que se deve retirar o Alojamento Local desta equação.

Secretária-geral da AHRESP - Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal

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