Alguém quer comprar um veículo elétrico?
À medida que o congestionamento do tráfego e a poluição do ar aumentam para taxas alarmantes em muitas cidades do mundo, os veículos elétricos estão a posicionar-se como uma alternativa Verde ao nível da mobilidade, em que os governos, a União Europeia e a própria indústria automóvel apostam fortemente neste segmento. Mas querem os consumidores comprar um veículo elétrico?
Independentemente das promessas tecnológicas, dos desafios para aumentar a vida útil das baterias, construir redes de infraestrutura de carregamento, e do preço da eletricidade, o grande desafio é fazer com que os consumidores os comprem.
Um estudo recente da Deloitte (Global Automotive Consumer Study 2022) prevê um futuro complicado. A boa notícia vem do setor de transporte profissional, onde as taxas de adoção são muito altas. Mas o mesmo não acontece com os consumidores finais que estão de acordo desde que sejam acessíveis e pelo menos tão bons quanto os de combustão interna.
Em países como os Estados Unidos, 69% dos compradores esperam que seu próximo veículo seja um veículo de combustão interna. Outros 22% optarão por algum tipo híbrido. Mas ainda assim, apenas 5% dos americanos antecipa que seu próximo veículo seja totalmente elétrico e a bateria. Na Coreia do Sul, por exemplo, esta taxa sobe para 23% dos compradores sendo na China é de 17%. Em quase todos os países, híbridos de combustão e híbridos plug-in parecem estar a ganhar popularidade como alternativas aos motores de combustão.
Em Portugal, de acordo com um estudo recente do Banco Europeu de Investimento (BEI), 84% dos compradores de automóveis manifestaram a intenção de optar por um veículo híbrido ou elétrico na próxima compra tendo em conta as alterações climáticas, e sendo este interesse maior que o da maioria dos cidadãos de qualquer outro país da UE. Por exemplo, em Espanha apenas 34% dos inquiridos admitiu vir a optar por um veículo elétrico, na Itália 27% e na Alemanha 23%.
Para tentar entender o perfil dos potenciais compradores de um veículo elétrico, realizámos um estudo sociodemográfico em Espanha. Com base numa amostra de 1205 potenciais compradores, segmentados por idade, sexo, nível educativo e económico, identificamos grupos de potenciais compradores. Os nossos resultados mostram que os homens têm maior preferência pelos veículos elétricos, e entre as mulheres, as mais jovens são as que menos interesse mostram neste tipo de veículos. Parte da justificação é que este grupo prefere o uso de transportes públicos ou transporte partilhado em relação à compra de carro próprio. Também interessa notar que a principal justificação para a preferência entre mulheres mais velhas são os temas da poluição e saúde, nomeadamente os problemas respiratórios.
Outro resultado relevante é que embora a Indústria automóvel promova os veículos elétricos a nível de marketing associando-o com os millennials e à Sustentabilidade, os resultados mostram que os jovens apresentam menor preferência pelos veículos elétricos, sendo o grupo de homens entre os 30 e os 60 anos, os que apresentam maior preferência por veículos elétricos. Os jovens têm mais conhecimentos nas áreas de tecnologia, sustentabilidade, e smart cities, mas mostram-se menos interessados na visão serviço (uso de car-sharing etc.) do que no produto "automóvel", para além das razoes económicas associadas ao preço de um veículo elétrico. Esta Visão de produto talvez seja a principal razão para a existência de tantas diferenças entre gerações e género.
O nosso estudo também mostra que o sexo em si não justifica as diferenças encontradas, e que pessoas com nível de educação e desempenho económico superior mostram uma maior preferência por veículos elétricos. Há um resultado curioso no grupo entre os 46 e os 60 anos - os homens mostram uma maior preferência para os veículos elétricos, mas as mulheres de maior nível educativo mostram ainda maior interesse do que os homens. Uma das principais razões é a preocupação deste grupo etário com a Sustentabilidade.
Como conclusão, é importante notar que o nosso estudo evidencia que os potenciais compradores de veículos elétricos não devem ser considerados como um grupo homogéneo, mas como um grupo heterogéneo com características sociodemográficas diferentes que podem ajudar os tomadores de decisões a desenhar e adotar melhores regras de negócios.
Ultimamente os governos estão a desenvolver planos mais agressivos para transformar a frota de automóveis em combustíveis alternativos. Mas a ambição é uma coisa e a realidade é outra. Chegou a hora de refletir sobre essa estratégia e colocar o foco não apenas no tipo de veículo, mas no conceito de transporte e mobilidade, mudando a Visão de um automóvel como produto para a de um serviço. No momento atual, a estratégia de adoção de veículos elétricos de tudo ou nada, é ainda muito complexa, bastante caótica e inadequada.
Vice-reitor programas pós graduação IE School of Science and Technology (IE University)