Desde há três anos para cá que, de tempos a tempos, se vai falando na negociação da paz na Ucrânia, sem que, até ao presente, se tenha obtido qualquer progresso nesse sentido.A Rússia, com base numa “legitimidade imperial histórica”, tomou a iniciativa de invadir a Ucrânia, no claro desrespeito pelo direito internacional e da Carta das Nações Unidas.Para Putin, a Ucrânia jamais deveria ter sido convertida num Estado independente, fazendo sentido que se tivesse mantido parte integrante do Império Russo, já que, infelizmente, segundo ele, o império soviético desapareceu.A Europa – isto é, a UE e mais alguns países democráticos europeus – apoiou a Ucrânia, o mesmo acontecendo com a generalidade dos Estados democráticos a nível mundial, a começar pelos EUA de Joe Biden.A Rússia que, a princípio, apenas pretendia apoiar comunidades russófonas no Leste da Ucrânia que aspiravam à criação de Estados independentes, em escassos meses passou a defender a pura e simples anexação de uma parte substancial do país, sendo certo que Putin, com o discurso claro que é típico dos líderes com tropismo totalitário, jamais deixou de dar a entender que pretende dominar totalmente a Ucrânia, numa demonstração de que, para ele, a subtileza de uma diplomacia sofisticada e inteligente não faz parte dos seus predicados.Entretanto, registou-se a mudança mais profunda de sempre na liderança do que se convencionou designar de Mundo Ocidental com a eleição de Trump para a Presidência dos EUA.Trump, que é, indubitavelmente, um importante activo da Federação Russa, tem, objectivamente, actuado no sentido de reforçar a capacidade negocial de Putin na Ucrânia.Começou por desvalorizar o papel da Europa, quando, pelos vistos, tal não deve ser feito pelas forças em presença no “espaço negocial”.Tem-se dito muito que a Europa “não existe”, que é uma “irrelevância”, mas a verdade é que, volvidos quase oito meses desde a posse de Trump e muitos meses desde a humilhação de Zelensky na Casa Branca, a Ucrânia e Zelensky levaram os próprios EUA a inflectir a sua actuação táctico-estratégica e a Ucrânia tem continuado a resistir no terreno. Sem a UE, sem a Europa democrática, a guerra já teria acabado com uma rendição da Ucrânia, tal como Trump começou por preconizar. Ou dito de outra forma, a guerra teria terminado com um acordo de capitulação da Ucrânia em relação à Rússia.Logo, goste-se ou não, a posição da Europa é relevante.Depois, Trump, com o objectivo de manter a aparência de uma certa neutralidade em relação à Rússia, começou a falar em sanções, a dois meses, depois, a duas semanas, depois, a doze dias e, até ao presente, nenhuma sanção foi imposta.Depois, o mesmo Trump começou a falar em negociações entre Putin e Zelensky, mas sem um horizonte temporal definido, aceitando sempre, nem que mais não seja por omissão, as condições prévias de Putin, isto é, que a Ucrânia tem que ceder todo o território pretendido pela Rússia, tem que se abster da entrada na NATO, senão mesmo na própria UE, passando a dispor de umas Forças Armadas com capacidade de intervenção limitada e que deve realizar eleições, a fim de substituir Zelensky por um qualquer dirigente subserviente em relação ao líder russo.Até ao presente, em oito meses de presidência, ainda não se ouviu uma exigência de Trump em relação a Putin no que toca às condições por este último propostas. Uma única.Apenas afirma que gostaria que ele se empenhasse na paz, sem explicar como e fazendo que tipo de concessões.Por outro lado, Trump receia, claramente, uma cimeira a três, envolvendo Putin e Zelensky, provavelmente porque da mesma resultaria a evidência da posição de subserviência de Trump em relação ao líder russo.Esta triste “saga” a que vamos assistindo parece não ter solução, pelo menos nos tempos mais próximos.Mas, estão enganados os que pensam que Putin vai, necessariamente, ganhar a guerra.Num ano, conquistou pouco mais do que um por cento do território ucraniano.Num ano, a Rússia viu a sua economia debilitada, com taxas de juro elevadíssimas, com as Finanças Públicas em situação particularmente difícil e permanecendo num contexto de isolamento do mundo mais desenvolvido.Entretanto, a UE e outros países da Europa e do Mundo Democrático continuam a ter capacidade para apoiar Zelensky.É ainda verdade que Trump não poderá esconder eternamente do povo americano a sua verdadeira estratégia para a Ucrânia e para Taiwan.E a ver vamos. Está por saber qual vai ser a reação do eleitorado americano quando se perceber de que lado está verdadeiramente Trump, se do lado dos que defendem os valores ditos “ocidentais” – que certa esquerda reconduz ao “capitalismo monopolista e imperialista” –, se do lado dos que defendem uma “nova ordem” de inspiração autoritária e assente numa mera análise da correlação de forças.Economista e professor universitárioEscreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico