A maternidade não é um romance... é mais uma tragicomédia

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A sociedade tem uma visão idealizada e romanceada da maternidade. As mães como seres perfeitos e imaculados, de paciência a transbordar e tom de voz sempre baixinho que, com muito mimo e carinho, lidam com as situações mais adversas sempre com um sorriso nos lábios.

Pois bem, isto não existe.

A maternidade (tal como a paternidade, já agora) não é um romance cor-de-rosa. É sim, diria, mais parecida com uma tragicomédia, misturando momentos de absoluto desespero com outros tantos de boas gargalhadas e situações hilariantes.

Antes de serem mães, são mulheres.
E são também filhas, amigas, companheiras, profissionais e desempenham tantos outros papéis. Têm, portanto, necessidades que vão muito além daquelas associadas ao cuidado dos
filhos.

As mães têm sono e fome como qualquer outro ser humano, precisam de lazer, de mimo e de algum silêncio. Têm sexo (ou gostariam de ter) e vontade de ver uma série, passear, tomar um banho de imersão ou estar simplesmente sem fazer nada.

As mães também têm muitas dúvidas, mas mesmo muitas. Sentem dificuldade em descodificar o choro dos seus filhos, em perceber qual a febre que justifica a medicação ou a ida às urgências, em introduzir novos alimentos ou retirar a chupeta. Sentem dificuldade em gerir os chichis e os cocós fora do sítio, em lidar com as birras e as alterações de comportamento, em ensinar as coisas da escola e em gerir os conflitos entre irmãos. Desesperam com o uso excessivo das tecnologias e oscilam muitas vezes entre estratégias de tudo ou nada, potenciando a revolta, a raiva e a oposição.

Questionam-se sobre como lidar com a mentira e outros comportamentos mais desafiantes, choram às escondidas (ou mesmo às claras) e contradizem-se a si mesmas, o que leva os filhos a acreditar que a manipulação é um bom caminho a seguir.

Às mães falta-lhes muitas vezes a paciência e o sentido de humor. São chatas e rabugentas, ralham e gritam, voltam costas e refugiam-se na casa de
banho.

Chegada a adolescência, os desafios avolumam-se. As mães não sabem como conversar sobre os namorados e as namoradas, o corpo e a sexualidade. Morrem de medo de uma gravidez precoce, das doenças e dos consumos. Percebem que os seus filhos cresceram e que tanto ficou por dizer e fazer. E culpabilizam-se.

Os filhos deixam o ninho e as mães questionam-se sobre qual será o seu papel dali em diante. E opinam sobre com quem se casam ou namoram e como devem educar as crianças que são, afinal de contas, os seus netos.

Não, a maternidade não é um romance. E é importante que a sociedade o assuma de forma clara, baixe as expectativas e pare de pressionar e criticar as mães, exigindo delas superpoderes. Deixemos as mães assumir as suas dúvidas e fragilidades, sem culpa nem medo de estigmatização, pois só dessa forma poderão também pedir ajuda. Sabendo que uma mãe que pede ajuda é forte e corajosa, e não uma mãe que falhou redondamente no seu papel maternal.

Psicóloga clínica e forense, terapeuta familiar e de casal

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