A interdependência europeia em energia e os Nord Stream

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Não obstante o aumento da produção na UE de energias renováveis (em 2019, 36,5% do total) e uma alta relevância da energia nuclear (32% do total), a importação de energia na UE tem vindo a aumentar. Desde 2013, todos os 27 países da UE são importadores líquidos de energia. Em 2019, a UE importava 60,7% da energia que nela é consumida. Seja no carvão (em 2019, 43,5% do total das importações da UE), no petróleo (26,8% do total) ou no gás natural (34,3% do total), empresas russas são as principais fornecedoras da UE. No petróleo, os países da UE importam ainda de empresas do Iraque (8,9%), da Nigéria (7,8%), da Arábia Saudita (7,7%), do Cazaquistão (7,3%), da Noruega (6,9%), da Líbia (6,2%), dos Estados Unidos (5,2%) e do Reino Unido (4,9%). No gás natural, os países da UE importam também de empresas da Noruega (13,2%), do Qatar (8,3%), da Argélia (7,7%), da Nigéria (5,3%), dos Estados Unidos (4,8%).

Apesar do aumento da capacidade instalada em energias renováveis, tudo indica que durante muitos anos a UE vai continuar dependente de fornecedores de energia da Rússia, da Noruega e de outros países referidos.

Não faltam analistas e políticos assinalando o perigo que é para a UE estar dependente em tão grande medida de fornecimento de energia por empresas russas. Esse receio tem vindo a ser especialmente exprimido relativamente aos Nord Stream, nomeadamente o Nord Stream 2, gasodutos ligando a Rússia à Alemanha e pertencentes a uma empresa sediada na Suíca (Nord Stream AG), tendo como acionistas a estatal russa Gazprom (51% do capital social), as companhias alemãs Wintershall Dea e PEG Infrastruktur AG (E.ON) (cada 15,5%), a sociedade holandesa Gasunie (9%) e a francesa Engie (9%). Parte das críticas provêm de países (Ucrânia, Eslováquia, R. Checa, Polónia) que perdem direitos de trânsito com o desvio de comércio de gasodutos que passam pelo seu território para os Nord Stream.

Sobretudo estão preocupados com a possibilidade de a Rússia passar a poder diminuir o seu fornecimento de gás sem afetar o abastecimento da Europa Ocidental. Esses receios são reforçados pelo facto de a Rússia ainda não ter ratificado o Tratado da Carta da Energia e por práticas abusivas da Gazprom em relação a pequenos países do Leste Europeu (ex.: Moldávia). Mas a crítica principal prende-se com os riscos de uma grande dependência do gás natural russo e o receio de que o fornecimento de gás pela Rússia possa ser usado como uma ferramenta política. Com exceção das preocupações americanas - que, sob a capa de preocupações geoestratégicas com a UE, parecem ser instrumentais para facilitar um maior escoamento da crescente produção de gás natural americano -, as preocupações e receios suscitados são legítimos.

Porém, os críticos dos Nord Stream esquecem-se de que a interdependência, não obstante tornar países rivais em parceiros económicos próximos, em vez de inimigos, e obrigando a um diálogo regular entre eles, permite uma excecional margem de manobra à parte economicamente mais forte; curiosamente, estes críticos conseguem ver isto nas relações da China com países economicamente menos robustos, mas já não conseguem ver isso nas relações entre a UE e a Rússia.


Consultor financeiro e business developer.
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