Os diretores das principais publicações de circulação nacional subscreveram um manifesto em defesa da imprensa e da Democracia. É uma rara tomada de posição conjunta, que se justifica com a possibilidade de, a partir de janeiro, virmos a ter oito distritos sem distribuição de jornais e revistas.A distribuição de publicações, em Portugal, é feita pela VASP, uma empresa pertencente ao grupo BEL (acionista do Diário de Notícias). Há muito que a distribuição nos distritos de Beja, Évora, Portalegre, Castelo Branco, Guarda, Viseu, Vila Real e Bragança é deficitária e os sucessivos governos têm sido alertados para o risco de, um dia, o interior ficar sem jornais impressos. Os governos de Luís Montenegro prometeram resolver o problema, através do lançamento de um contrato público internacional para garantir a distribuição em todo o país, no âmbito do tão falado plano de apoio aos media, mas já passou um ano e nada foi feito. Na semana passada, quando confrontado com a notícia de que a VASP poderá suspender a distribuição no interior, o ministro Leitão Amaro respondeu que o Governo “não quer passar cheques a nenhuma empresa em concreto” e que qualquer solução implicará a existência de “mecanismos concorrenciais”.É difícil compreender esta posição. A que “mecanismos concorrenciais” se refere Leitão Amaro? Desconhecerá, eventualmente, que o seu antecessor, Pedro Duarte, deixou preparado o lançamento de um concurso internacional que assegurava a existência de concorrência na atribuição de uma concessão de serviço público? Procedimento este que seria aberto à VASP e a quaisquer outras empresas nacionais e estrangeiras que estejam dispostas a assegurar a distribuição de jornais e revistas nos distritos onde a mesma não é economicamente viável.Em contrapartida, o Governo pode ter mudado de ideias e chegado à conclusão de que a existência de publicações em papel não é essencial para a literacia da população e para a própria Democracia. Podemos discordar profundamente, mas seria uma posição legítima. O que não será legítimo é ocultar tal posição através de subterfúgios retóricos. Caso exista, o Governo deve assumir essa posição de forma aberta e transparente. Por outro lado, é impossível não encarar esta atitude do Governo como um possível condicionamento da imprensa, porque ainda que a intenção não seja essa, o resultado será a existência de um grande ponto de interrogação nos planos de negócio dos grupos de comunicação social para o próximo ano. No caso do DN, desde há vários anos que a nossa circulação em papel é reduzida, uma vez que o nosso modelo de negócio está muito voltado para o digital (fechamos o mês passado com mais de três milhões de leitores em www.dn.pt). Mas para outros jornais nacionais, que vendem diariamente dezenas de milhar de exemplares em papel, a não resolução desta questão, sem qualquer explicação válida e um mínimo de previsibilidade, é algo que pode ter um impacto significativo nos respetivos modelos de negócio. O que está a acontecer é muito grave e, independentemente da intenção, trata-se de uma espada de Dâmocles que paira sobre jornais e revistas que, em alguns casos, têm liderado a cobertura sobre a Spinumviva e outros temas incómodos. Repito: pode não ser essa a intenção, mas o resultado desta inação poderá ser visto como um condicionamento da imprensa. E, em política, o que parece é.Diretor do Diário de Notícias