A IA e a cegueira sindical reacionária

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Portugal enfrenta uma tempestade perfeita: uma demografia envelhecida, uma economia de baixos salários e, agora, o choque sísmico da Inteligência Artificial. Mas, enquanto o mundo discute a ética dos algoritmos, a nossa Concertação Social discute o século XX.

A lei portuguesa e os seus mentores tentam preservar a função laboral como uma peça de museu. Mas a realidade não respeita decretos. A automação permitida pela IA vai extinguir funções, quer a lei permita ou não. A verdadeira segurança laboral do século XXI não pode residir na proibição administrativa do despedimento, mas na garantia robusta do reskilling de cada indivíduo. E não se trata das 40 horas anuais de formação para “cumprir calendário” ou de aprender a mexer numa nova versão do Excel. É preciso garantir reskilling profundo. Dar a cada um a possibilidade de uma metamorfose profissional: obrigar a empresa a financiar a transformação de um administrativo, cuja tarefa será automatizada, num gestor de dados ou técnico especializado, antes de sequer pensar em despedi-lo. Proteger o trabalhador hoje não é garantir que ele faz a mesma tarefa para sempre (algo impossível), mas garantir que ele não se torna obsoleto quando essa tarefa desaparecer. Claro que se ele não estiver para isso…

E é aqui que reside a tragédia paradoxal. Os sindicatos portugueses, sempre porta-estandartes do “progresso”, na realidade são hoje forças reacionárias. Recusam-se sequer a desenhar estas novas regras. Não pensam que, ao bloquearem a adaptação da lei aos desafios digitais, não travam a tecnologia; garantem apenas que ela avança (sempre!) só que de forma desregulada.

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