A Estratégia de Segurança Nacional Americana. Um Cenário de Incerteza para a Europa

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A Ordem saída do fim da Segunda Guerra Mundial está moribunda e o processo é irreversível. O futuro permanece incerto, os contornos da nova Ordem são opacos e os indícios não são de molde a deixar-nos tranquilos. O divórcio das nações, e o fim do concerto das nações, como acontecido antes dos dois grandes conflitos mundiais do século XX, é cada vez mais uma realidade.

O US National Security Strategy-NSS de 2025 (Estratégia Nacional de Segurança) é a prova do pensamento da nova Administração em Washington, sobre o nacionalismo e o isolacionismo americano. É a assunção definitiva da mudança do paradigma estratégico americano que saiu do pós guerra.

O NSS expressa claramente o regresso ao velho conceito do século XIX “A Paz através da Força” e mais grave um regresso à “Doutrina Monroe”, como um dos principais objetivos da estratégia americana. Representa definitivamente a mudança dos interesses estratégicos americanos para o eixo Índico/Pacífico. A Europa deixou de ser prioritária.

O documento assume que a Europa deixou de ser um aliado confiável, e elege a União Europeia como principal adversário, visto como um projeto de elites liberais e internacionalistas. Acusa as economias europeias de estarem em declínio, devido à excessiva regulação, e sugere que alguns países europeus correm o risco de um “apagamento civilizacional”.

Na conferência de segurança de Munique em fevereiro deste ano, o vice presidente americano, JD Vance, foi muito claro e duro nas suas críticas aos países europeus e à UE. A restrição às liberdades de religião e consciência e princípios antidemocráticos, eram, nas suas palavras, pecados maiores na Europa.

As teorias conspirativas, tão populares na direita radical americana, são hoje uma normalidade nas direitas radicais europeias, nomeadamente a teoria da “grande substituição”. Interessantemente aparece de novo nos escaparates das livrarias internacionais, o livro The Camp of the Saints, do escritor francês Jean Raspail. Escrito em 1973, é uma novela distópica e um libelo à teoria da “Grande Substituição”, hoje tão popular nas direitas radicais americana e europeia.

Para os europeus o NSS é completamente inaceitável, está repleto de frases lamentáveis, e algumas afirmações são uma direta interferência nos processos eleitorais europeus. O objetivo da atual Administração americana é criar o caos e o enfraquecimento económico da Europa e simultaneamente, ameaçando com o apoio aos partidos patrióticos europeus.

Há vozes discordantes na América, nomeadamente nas áreas da finança e da indústria, com fortes críticas ao documento e a Donald Trump. Muitos são críticos das afirmações, de que a Europa caminha na direção do “apagamento civilizacional”, afirmando que uma Europa fraca é um enorme risco para a América. Sublinham, uma Europa fragmentada causará mais danos que a qualquer um, porque os europeus são um maior aliado em todos os sentidos, incluindo valores comuns, que são realmente os mais importantes.

As alianças, por mais sólidas que possam parecer, não têm carácter perpétuo. Esta visão estratégica americana, marcada pelo nacionalismo e isolacionismo, é um enorme erro. A rutura transatlântica poderá ter consequências negativas futuras, inclusive para os interesses americanos. Não obstante as divergências políticas e estratégicas do momento, é inegável a força dos laços culturais que unem a Europa e a América, forjados ao longo de séculos. Desistir da América será sempre um erro. A Europa continua a necessitar da América, assim como os Estados Unidos beneficiam da parceria europeia.

Portugal não é um país periférico, ao contrário do que muitos afirmam, a nossa geografia, o Atlântico e o Mar dos Açores, são a nossa mais-valia estratégica. O nosso país está no hemisfério ocidental, somos membros da Aliança Atlântica, e a América é um parceiro e um aliado prioritário. A nossa diplomacia terá de ser muita cuidadosa na análise da nova estratégia de segurança americana.

Tenente-general Pilav (REF). Membro do OS&D da SEDES

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