A ciência escolar e as mulheres portuguesas que se agigantam na ciência

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É simples, mas continua por fazer. É necessária uma reforma curricular que valorize os processos de produção do conhecimento científico, integrando no desenho curricular ciência, engenharia e matemática, com extensões à arte e ao design. É simples, mas continua por assumir uma perspetiva curricular adequada às necessidades do mundo contemporâneo.

O deslumbramento e o entusiasmo com o conhecimento científico e os processos da ciência deveriam constituir uma das mais intensas experiências da escolaridade obrigatória. Mas não é isso que acontece. A ciência escolar continua a não proporcionar oportunidades suficientes para o envolvimento dos alunos em atividades práticas e experimentais. Passam-se anos, no 2º e 3º ciclos do Ensino Básico, sem que os alunos entrem num laboratório. Conheço casos de estudantes do curso de Ciências e Tecnologias do Ensino Secundário com reduzidíssimas experiências de trabalho prático experimental e laboratorial.

Nos últimos anos, Portugal tem investido na criação de clubes Ciência Viva na escola. Mas é preciso muito mais do que isso. Até porque, habitualmente, estes clubes ficam nas escolas-sede dos Agrupamentos, sendo poucas ou nenhumas as oportunidades de envolvimento das crianças mais novas.

Tudo isto, e apesar disto, estimado Leitor, para lhe pedir que se associe a mim numa merecida homenagem às mulheres portuguesas que se agigantam na ciência.

Salomé Pinto, investigadora do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (I3S), da Universidade do Porto, conseguiu obter um financiamento de 10 milhões de euros para estudar os mecanismos que permitem o desenvolvimento das doenças autoimunes. O seu foi um dos apenas 29 projetos financiados em toda a Europa pelo altamente competitivo European Research Council (ERC).

Ao mesmo tempo, o portal Research.com divulgou a primeira edição do ranking das 1000 mulheres cientistas mais relevantes do mundo. O principal objetivo deste ranking é aumentar a visibilidade e as oportunidades de carreira das mulheres na ciência. De acordo com este ranking, as mulheres trabalham predominantemente no campo das ciências da vida (63,7%), com particular destaque para as ciências médicas (46,8%). Pois aí consta, também, uma portuguesa: Isabel Ferreira, do Instituto Politécnico de Bragança, atual secretária de Estado do Desenvolvimento Regional.

Um estudo recente concluiu que, embora lentamente, tem-se vindo a registar um crescimento consistente da participação das mulheres na ciência, com uma predominância nas ciências da vida, ciências da terra, espaço e oceano, e ciências físicas. As mulheres ocupam atualmente cerca de 33% do emprego científico no mundo. Em Portugal, o panorama é mais animador, já que as mulheres representam cerca de 45% da totalidade dos investigadores, que, desde 2015, aumentou cerca de 86,5%.

Mas um outro estudo demonstrou que as mulheres-cientistas tendem a ser menos reconhecidas do que os homens, tendo menor probabilidade de verem o seu nome associado a uma patente ou artigo científico. No caso dos cursos de pós-graduação, esta probabilidade é de apenas 14,97% para as jovens investigadoras, sendo cerca de 21,47% para os homens. Tudo isto, embora esteja em mudança, reflete as desigualdades de género que persistem nas nossas sociedades, particularmente dentro da indústria e da ciência, campos tradicionalmente geridos por homens, que tenderam a excluir e desvalorizar as contribuições das mulheres.

Professor do Ensino Superior

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