A boa e a má corrupção

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Uma intrigante distinção é a que fazem muitos comentadores televisivos, seguindo o exemplo dos que opinam nos programas desportivos, entre corrupção boa e corrupção má.

Destes aprenderam que se um jogador se atira para o chão simulando uma falta dentro da grande área do adversário, ele pode ser apresentado como um jogador inteligente, digno de louvor, capaz de conseguir um penalti a favor da sua equipa em vez de um simples batoteiro digno de censura.

Destes aprenderam que grande parte do público confrontado com esta forma de ver o mundo, aceita passivamente transmutar a água em vinho, aceita que a batota passe por inteligência, que o censurável seja elevado ao Olimpo. O público, ou parte dele, aceita o inaceitável porque o ato foi cometido por "um dos nossos". Prova de que o número dos que têm valores morais sólidos é pequeno na nossa sociedade. Para o maior número só conta o seu interesse pessoal ou quando muito o interesse do seu grupo. Valores acima desses pequenos, mas enormes se medidos em cifrões, interesses deixaram de existir.

Assim, hoje se um socialista é acusado de corrupção temos logo um rol de comentadores escandalizados a gritar contra o roubo do erário público, contra os desmandos socialistas, contra a falta de ética. Quando é um social-democrata a ser acusado do mesmo aí estamos em zona cinzenta, é inocente até prova em contrário, a justiça está viciada e é manipulada por poderes ocultos (talvez até a Maçonaria regular, os judeus, ou qualquer outra organização tenebrosa). Quando os mesmos indivíduos são capazes de num mesmo telejornal defender estas duas posições de seguida, no mesmo fôlego e sem pestanejar, atingimos o cume da hipocrisia, da falta de valores e o primado da simples defesa de interesses que apesar de mesquinhos, sobem para lá da ideia de Justiça, para lá da ética, para lá da decência.

Dá uma volta ao estômago. Uma náusea prolongada. Uma dor de alma. Um lamento pelo nosso Portugal.

Na verdade estes comentadores não combatem a corrupção, combatem o adversário político usando como arma de arremesso a corrupção dos membros do lado oposto. E, obviamente, defendem com unhas e dentes os corruptos do seu lado. Péssimo. O combate à corrupção devia ser um desígnio nacional não uma arma política na conquista de lugares de poder.

Eu, e tantos, que temos aversão real e genuína à corrupção, pelo mal que faz ao país e aos portugueses, sabendo que essa malfadada prática se paga em atraso económico e social, não podemos deixar de olhar com perplexidade para toda esta degradação moral da nossa sociedade.

Não podemos deixar de pensar que é necessário pôr-lhe um travão, dar-lhe um fim. Que a classe política do unipartidarismo real (PS/PSD irmãos siameses indistinguíveis) já deixou de há muito de servir o país e, hoje, só lhe trás desgraças e dissabores, atraso e emigração.

Portugal precisa de mudar. E com urgência. É preciso encontrar força e ânimo para o fazer.

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