Brutalidade Policial
Ainda estava no ar o cheiro a pólvora dos disparos indignados, vindos de todos os quadrantes políticos, contra os peritos da Organização das Nações Unidas que, depois de uma visita ao nosso país, denunciaram a brutalidade policial contra as populações não-brancas quando rebentou o escândalo das torturas praticadas pela Guarda Nacional Republicana (GNR) no Alentejo, que veio dar razão aos peritos e calar os negacionistas.
Para já, e para além dos processos judiciais em curso, nem a GNR nem o Estado português assumiram a responsabilidade nem indemnizaram as vitimas. Muito lamentável.
Parece ser cada vez mais uma política oficial do Partido Socialista de recusar que o Estado assuma a responsabilidade pelos atos dos seus agentes. O atropelamento com o carro do ministro Cabrita é um bom exemplo desta política. No caso do cidadão ucraniano assassinado foi mesmo necessária a intervenção da Comissária Europeia para que o Estado assumisse a responsabilidade.
Isto é extremamente grave porque o cidadão em face de um Polícia, de um GNR, de outro qualquer agente, não sabe se este está a agir de livre iniciativa ou em funções. A regra parece ser - se fizer bem é agente do Estado, se prevaricar está a agir por conta própria. Uma regra inaceitável em que o Estado lava as mãos e não se coíbe mesmo de manter em funções os criminosos - como no caso dos polícias envolvidos em brutalidade na esquadra de Alfragide mesmo depois de condenados, como no caso vertente.
Esta atitude aumenta a desconfiança que as populações já depositam nas Policias nunca se sabendo se vão defender a Lei ou praticar brutalidades que depois ficam impunes.
É também a confissão de uma muito preocupante fragilidade do Estado português que não tem mão nos seus agentes, não os consegue disciplinar nas instituições que os enquadram, e lhes dá roda livre para praticarem as atrocidades mais vis sobre as populações racializadas ou socialmente debilitadas. É inadmissível.
A impressionante frequência da brutalidade policial, o perfil das vítimas - sempre pessoas racializadas ou socialmente frágeis, a incapacidade das polícias em disciplinar os seus elementos são factos muito preocupantes que apontam para que sejam forças institucionalmente racistas - isto é em que a estrutura de comando, as regras, a inspeção, a educação, a cultura são racistas, independentemente deste ou daquele agente ou oficial o ser ou não.
É, pois, tempo de agir e nomear uma comissão independente, que inclua membros da sociedade civil e das comunidades racializadas, que investigue os métodos e as práticas destas instituições e proponha as medidas necessárias à sua urgente reforma.
É urgente para que Portugal possa dissipar esta imagem internacional de brutalidade policial, de racismo sistémico, de injustiça e de ausência de Estado de Direito.
Uma tal imagem afasta o investimento, assusta o turismo, prejudica os portugueses que vivem no exterior, divide a comunidade de língua oficial portuguesa, diminui os graus de liberdade da nossa política externa. Em suma não para além de desumana não serve Portugal nem os portugueses.